O "reparoma humano" permitirá que pesquisadores de todo o mundo consultem como 20.000 genes humanos afetam o reparo do DNA.
MADRID, 3 out. (EUROPA PRESS) -
Pesquisadores do Centro Nacional de Pesquisa do Câncer (CNIO) da Espanha criaram o "reparoma humano", um catálogo de "cicatrizes" de DNA que ajudará a definir tratamentos personalizados para o câncer.
Essa ferramenta - REPAIRome - permitirá que pesquisadores de todo o mundo consultem rapidamente como cada um dos 20.000 genes humanos afeta o reparo do DNA, de acordo com seus autores publicados na revista 'Science'.
O grupo do CNIO identificou os 20.000 tipos de cicatrizes que permanecem no DNA humano reparado após uma quebra. Em seguida, eles os organizaram em um site, o portal do reparo humano, que está disponível para a comunidade científica mundial. Assim, ele se torna o catálogo de padrões de cicatrizes no DNA humano reparado.
Essa é uma informação muito valiosa como conhecimento básico, mas também do ponto de vista médico. Por exemplo, a capacidade de interpretar o padrão de cicatriz nas células tumorais de um paciente pode ajudar a determinar o melhor tratamento para cada câncer.
"Este é um trabalho ambicioso, que esperamos que se torne um recurso realmente útil na pesquisa do câncer e também na prática clínica", diz Felipe Cortés, chefe do Grupo de Topologia e Quebra de DNA do CNIO e principal autor do estudo.
Para Ernesto López, um dos primeiros autores do estudo, "foi um esforço árduo e consciencioso porque existem cerca de 20.000 padrões, tantos quanto os genes no DNA humano".
O DNA, que está presente em todas as células, é continuamente quebrado pelo funcionamento da própria célula, muitas vezes por motivos tão comuns como a exposição ao sol, mas essas são lesões perigosas que a célula precisa reparar para sobreviver.
Esses reparos deixam para trás o que os pesquisadores chamam de "impressão digital mutacional" ou, metaforicamente, as cicatrizes deixadas para trás após o reparo, que revelam informações importantes e outros detalhes sobre, por exemplo, como a célula reparou a quebra.
Assim, a decodificação da cicatriz para entender o dano original e seu reparo é importante em muitas áreas de pesquisa e, especificamente, no câncer. "Isso é muito relevante para o tratamento do câncer, porque muitas terapias contra o câncer funcionam precisamente provocando quebras no DNA", explica Cortés.
Os tratamentos contra o câncer geralmente param de funcionar porque as células tumorais aprendem a reparar as quebras produzidas pelos medicamentos, o que torna os tumores resistentes à terapia. Assim, entender como a célula repara as quebras em cada caso pode ajudar a superar a resistência.
O padrão de cicatrizes que permanece no DNA de uma célula é diferente dependendo de quais genes estão ausentes ou presentes, e esse é o aspecto fundamental que possibilitou o avanço atual. A conquista do grupo CNIO foi revelar como cada um de nossos genes afeta a formação de cicatrizes.
COMO É O "REPAROMA HUMANO
O "reparoma humano" contém todos os padrões possíveis de cicatrizes: ele analisa o rastro mutacional causado por quebras de DNA em 20.000 populações diferentes de células, cada uma sem um gene específico.
Dessa forma, "se você observar determinadas cicatrizes no DNA de tumores, poderá inferir quais genes não estão funcionando, e isso é útil para projetar tratamentos específicos", explica Cortés.
Os pesquisadores do CNIO geraram cerca de 20.000 populações de células diferentes, desativando (desligando) um gene diferente em cada uma delas; em seguida, causaram quebras em cada uma delas, usando a ferramenta de edição de genes CRISPR. Por fim, eles observaram a marca (cicatriz) deixada na molécula depois que a célula reparou a ferida.
Um dos principais avanços que tornaram o estudo possível foi a realização dessa análise maciça simultaneamente em todas as 20.000 populações, em vez de uma por uma. Trata-se de um desenvolvimento tecnológico específico que tem valor por si só e "pode ser usado em estudos futuros que visem analisar simultaneamente o efeito de todos os genes humanos", diz Israel Salguero, coautor do estudo.
Além disso, "isso exigiu um esforço computacional significativo, incluindo o desenvolvimento de novas ferramentas de análise e representação", diz Daniel Giménez, pesquisador do grupo Chromosome Dynamics do CNIO, também coautor do estudo. Por esse motivo, os grupos de Oncologia Computacional e Integridade Genômica e Biologia Estrutural do CNIO também estão participando dessa pesquisa.
REPAIRome' é um catálogo que mostra como cada um dos aproximadamente 20.000 genes humanos influencia os padrões de mutações que resultam do reparo de quebras de DNA", explicam os autores. O REPAIRome pode fornecer informações sobre os mecanismos de reparo do DNA, melhorar a edição de genes e explicar os padrões de mutação observados no câncer.
O portal da Web REPAIRome permitirá que pesquisadores de todo o mundo consultem rapidamente como qualquer gene humano afeta o reparo do DNA, analisem as correlações funcionais entre os genes e explorem as vias moleculares envolvidas. Seus autores consideram o REPAIRome "uma plataforma para novas descobertas", acrescenta Cortés.
De fato, os autores já publicaram na Science as descobertas que o REPAIRome já possibilitou. Entre elas estão novas proteínas envolvidas no reparo do DNA, tanto promovendo quanto impedindo esse reparo.
Eles também descobriram um padrão de mutações associadas ao câncer de rim e também a condições de baixa oxigenação (hipóxia) em outros tumores. Essa é uma descoberta que pode levar a novas abordagens terapêuticas no futuro.
O REPAIRome tem como alvo específico o reparo de um dos tipos mais graves de danos ao DNA, as quebras de fita dupla do DNA (DSBs). Essa é a quebra simultânea de ambas as fitas da dupla hélice da molécula de DNA e pode ser causada por um erro durante a replicação do DNA ou por fatores externos, como exposição a raios X, luz solar (radiação UV) ou medicamentos.
Na verdade, a quimioterapia e a radioterapia contra o câncer matam as células tumorais causando essas quebras, daí a importância biomédica de entender como elas são reparadas e como impedir o reparo. O conhecimento do reparoma humano pode, nesse sentido, ajudar a identificar novos alvos terapêuticos.
Eles também esperam que isso contribua para aprimorar as ferramentas atuais de edição de genes, já que os novos sistemas CRISPR-Cas se baseiam precisamente na indução de quebras para causar alterações específicas no DNA.
"Compreender em profundidade como os mecanismos de reparo de quebra de fita dupla operam (...) é uma área de extraordinário interesse, com implicações para a saúde humana, incluindo a biologia e o tratamento do câncer, bem como para nossos esforços em direção ao controle total das tecnologias de edição de genes CRISPR-Cas", escrevem eles na Science.
O 'REPAIRome' "é um recurso poderoso para a comunidade científica e, especialmente, para os interessados no reparo de DSB e no uso biotecnológico e médico dos sistemas CRISPR-Cas", acrescentam.
Esse projeto foi financiado com fundos públicos estaduais e europeus por meio do programa conjunto "A way of making Europe" do Ministério da Ciência, Inovação e Universidades da Espanha (Agencia Española de Investigación, AEI) e fundos do FEDER. Alguns dos pesquisadores participantes receberam principalmente financiamento estatal da AEI e da Comunidade Autônoma de Madri, além de subsídios da Fundação 'la Caixa' e da Associação Espanhola Contra o Câncer (AECC).
Novo catálogo de DNA promete avanços em terapias personalizadas contra o câncer
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