EUA negarão visto a autoridades 'cúmplices de censura a americanos'

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O secretário de Estado dos Estados Unidos, Marco Rubio, anunciou nesta quarta-feira, 28, que o país vai vetar visto para "autoridades estrangeiras e pessoas cúmplices na censura de americanos". Sem citar o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes diretamente, ele mencionou a América Latina como um dos exemplos de aplicação.

 

"Estrangeiros que trabalham para minar os direitos dos americanos não devem ter o privilégio de viajar para o nosso país. Seja na América Latina, na Europa ou em qualquer outro lugar, os dias de tratamento passivo para aqueles que trabalham para minar os direitos dos americanos acabaram", afirmou Rubio.

 

A mensagem foi, no começo da tarde de ontem, traduzida para o português pela Embaixada dos EUA no Brasil. O secretário disse que está combatendo a "censura flagrante" no exterior contra empresas de tecnologia americanas. No entanto, Rubio não informou quem são os alvos da medida, não deu mais detalhes sobre quais seriam as restrições nem quando elas entrariam em vigor.

 

"Hoje (ontem), anuncio uma nova política de restrição de vistos que se aplicará a autoridades estrangeiras e pessoas cúmplices na censura de americanos", escreveu ele no X. "A liberdade de expressão é essencial ao estilo de vida americano - um direito inato sobre o qual governos estrangeiros não têm autoridade."

 

O anúncio ocorre após o próprio Rubio dizer, na semana passada, que havia uma grande possibilidade de Moraes ser alvo de sanções por parte do governo de Donald Trump.

 

Ex-assessor de Trump, o consultor do governo americano Jason Miller citou o ministro do STF em uma publicação no X, ontem, logo após o anúncio da restrição. Miller escreveu: "Compartilhe isso com a primeira pessoa que vier à sua mente ao ler isto. Tudo bem, vou começar... Olá, @Alexandre!", postou, marcando o perfil de Moraes que está desativado.

 

O menção à Europa pelo secretário de Estado dos EUA faz eco às críticas do vice-presidente J.D. Vance. Durante a Conferência de Munique, em fevereiro, Vance criticou aliados europeus dos EUA por estarem supostamente limitando a liberdade de expressão de americanos, em referência às medidas para conter a disseminação de discurso de ódio nas redes sociais e à recusa de incluir partidos de extrema direita em suas coalizões de governo.

 

Segundo o jornal britânico The Guardian, o governo Trump vem aumentando a pressão sobre a legislação europeia para regulamentar os serviços digitais, alegando que isso equivale a uma "censura digital". A Lei Europeia de Serviços Digitais (DSA, na sigla em inglês) estabelece regras para plataformas e busca fortalecer direitos dos usuários e responsabilizar empresas de tecnologia.

 

Como parte das negociações tarifárias, o governo Trump tenta fazer com que a União Europeia reverta essas regulamentações digitais em defesa das gigantes de tecnologia americanas, muitas das quais apoiam Trump. As autoridades americanas, por exemplo, classificam a legislação como "incompatível" com a liberdade de expressão nos EUA.

 

Alcance

 

O advogado Marcelo Godke, doutor em Direito pela USP e especialista em Direito Internacional, disse que, "em tese", a restrição pode ser aplicada a Moraes e "vai depender do alcance da medida em si". "Todo visto de visitante é um 'privilégio' emitido pelo país de destino. O mesmo se aplica ao Brasil, não só aos EUA. O visto de visitante - e mesmo o de residência - é sempre 'precário' e pode ser revogado a qualquer momento a critério do país emissor e de acordo com sua conveniência. O período de validade não garante que o visto não seja revogado antes do prazo expirar." Segundo Godke, a medida pode ser aplicada a qualquer autoridade brasileira, de acordo com os interesses da gestão americana.

 

Ao comentar a nova medida do governo Trump, durante audiência na Comissão de Relações Exteriores da Câmara, o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, afirmou que conceder vistos a estrangeiros é "decisão soberana de cada país". "A questão de conceder visto é única e exclusivamente da alçada do país que emite o visto. Acho até que, por isso, é muito importante termos também uma exigência de vistos para muitos países", disse o chanceler, ressaltando que a medida não pode se estender a vistos oficiais para integrantes de reuniões multilaterais.

 

No ano passado, Moraes se envolveu em embate público com o empresário Elon Musk, dono do X, e foi acusado de censura. Desde que o ministro começou a investigar possível propagação de fake news pela plataforma, o empresário passou a afirmar que o magistrado infringe os princípios da liberdade de expressão.

 

Na época, ainda no governo de Joe Biden, a Embaixada dos EUA no Brasil defendeu em nota a liberdade de expressão ao se referir ao impasse entre ministro e empresário. Sem comentar as decisões de Moraes, a representação americana afirmou que "a liberdade de expressão é pilar fundamental em uma democracia saudável".

 

Ofensiva

 

Bolsonaristas estão em uma ofensiva para que autoridades americanas enquadrarem Moraesna Lei Global Magnitsky, algo sem precedentes para um ministro de uma Corte Suprema de uma democracia. A lei, diferentemente da decisão anunciada ontem, estende a punição para além da concessão de visto. Entre as punições estão a proibição de viagem aos EUA, o congelamento de bens no país e o veto a qualquer empresa ou pessoa no país de realizar transações econômicas com o indivíduo punido.

 

Levantamento do Estadão, com base em mais de 2.250 registros de sanções aplicadas pela Lei Global Magnitsky entre 2022 e 2025, mostra que os alvos típicos da medida são autoridades de regimes autoritários, integrantes de grupos terroristas, criminosos ligados a esquemas de lavagem de dinheiro e agentes de segurança acusados de assassinatos em série. O caso brasileiro rompe com o padrão histórico.

 

O cientista político e professor de Relações Internacionais da FGV-SP Guilherme Casarões destacou que uma eventual sanção contra Moraes com base na Lei Global Magntsky seria inédita desde a criação da norma. "Atingir ministros de Supremas Cortes, um ministro da instituição máxima do Judiciário brasileiro, é a novidade na aplicação desta lei. Seria a primeira vez desde a sua criação", afirmou.

 

Casarões disse que o caso mais próximo envolveu ministros de Estado da Turquia responsabilizados pela prisão de um pastor americano em 2016, durante a onda repressiva que se seguiu à tentativa de golpe contra o governo de Recep Tayyip Erdogan. No poder desde 2003, Erdogan liderou um processo que levou milhares de opositores à prisão, entre eles jornalistas, militares e lideranças religiosas.

 

No caso de juízes de Cortes Superiores, o episódio mais emblemático envolveu o Tribunal Supremo de Justiça da Venezuela, cujos membros foram sancionados em 2017 após decisões que permitiram ao ditador Nicolás Maduro governar por decreto e dissolver a Assembleia Nacional.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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A maior parte dos brasileiros reprova a atuação dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). De acordo com pesquisa divulgada nesta terça-feira, 5, pelo Datafolha, 36% dos entrevistados consideram ruim ou péssimo o trabalho dos magistrados.

O estudo também constatou que aqueles que consideram as decisões dos juízes são ótimas ou boas somam 29%. Enquanto isso, 31% pensam que os ministros têm desempenho regular e 4% dos entrevistados não sabem opinar.

Dentre os entrevistados, a maioria (68%) considerou que a Corte prioriza os próprios interesses e apenas 27% afirmaram que eles pensam em primeiro lugar na população.

A medição foi feita pelo instituto entre os dias 29 e 30 de julho, ou seja, antes da prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), por desobedecer as medidas cautelares, ser decretada pelo ministro Alexandre de Moraes.

Após a prisão do ex-presidente, seus apoiadores e filhos desferiram ataques contra a Corte, afirmando que o Tribunal minou a democracia brasileira e pedindo o impeachment de Moraes. Os deputados Luciano Zucco (PL-RS) e Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) incentivaram seguidores a usar os termos "vingança não é justiça" nas redes sociais, para atacar o STF.

A pesquisa demonstrou que, dentre os bolsonaristas, 81% reprovam o trabalho dos ministros do STF e apenas 2% são favoráveis. Os petistas, por outro lado, são mais alinhados com a Corte: 59% têm avaliação positiva e 9% negativa.

A reprovação do STF subiu desde a última medição realizada pelo Datafolha. Em março de 2024, 28% dos brasileiros reprovavam a Corte e uma ligeira maioria, de 29% dos entrevistados, era a favor da atuação. Na ocasião, 40% dos participantes ainda consideraram os ministros com atuação regular e 3% não opinou

Desde a data, os embates entre o Supremo e atores políticos aumentaram. Oito magistrados da Corte chegaram a ser sancionados com a cassação de seus vistos americanos em retaliação ao processo que conduzem contra Jair Bolsonaro, investigando a participação do ex-presidente na tentativa de golpe de Estado.

O principal articulador das sanções é o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que está autoexilado nos EUA e pede pelos ataques. O parlamentar também pediu pela aplicação da Lei Global Magnistsky contra Alexandre de Moraes, o dispositivo legal o impede de acessar bens nos EUA, de visitar o país e de ter acesso a serviços de empresas americanas.

De acordo com pesquisa Datafolha divulgada nesta terça-feira, 5, 35% dos brasileiros consideram a atuação do Congresso Nacional ruim ou péssima. Ao mesmo tempo, os entrevistados que acham o trabalho dos parlamentares regular somaram 41%. Apenas 18% dos participantes afirmaram que o Legislativo é ótimo ou bom, enquanto 6% não opinaram.

A reprovação da Câmara dos Deputados e do Senado, manifestada pela maior parte dos entrevistados, é acompanhada por uma percepção de que o Legislativo privilegia os próprios interesses. Ao todo, 78% dos entrevistados afirmaram que os congressistas dão prioridade a eles mesmos. Somente 18% dos participantes acreditam que o povo é prioridade no Congresso.

A desaprovação ao Congresso se elevou desde a última aferição feita pelo Datafolha. Em março do ano passado, 23% consideravam o Legislativo ruim ou péssimo e 22% ótimo ou bom. A avaliação de que os parlamentares atuavam de forma regular era compartilhada por 53% na ocasião. Por fim, 2% não responderam a pesquisa.

O aumento da desaprovação ocorre após embates entre o Congresso e Executivo. Os senadores e deputados federais acumulam uma série de atritos com a presidência, como a derrubada do aumento do IOF, de interesse do presidente Lula (PT), e o veto do aumento no número de deputados, desejo da Câmara.

Governistas chegaram a levantar uma campanha nas redes sociais com os dizeres "Congresso inimigo do povo" para atacar as Casas. O governo usou, durante esse período, diversos posts feitos com inteligência artificial para criticar a Câmara e o Senado.

Dentre os petistas, a pesquisa identificou que 28% avaliam o Congresso como ruim e 26% bom ou ótimo. Os bolsonaristas, em maior parte, também rejeitam o Legislativo: 38% consideram que a atuação dos senadores e deputados federais é ruim e apenas 14% a avaliam como boa.

A pesquisa 2004 pessoas entre os dias 29 e 30 de julho. A margem de erro do estudo é de dois pontos percentuais e a confiabilidade é de 95%.

O presidente da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados, deputado federal Paulo Azi (União-BA), definiu na tarde desta terça-feira, 5, as diligências que serão realizadas no processo de cassação do mandato da deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), que está presa em Roma, na Itália, desde o último dia 29.

Segundo Azi, a fase de instrução probatória do processo inclui a oitiva da deputada, a ser realizada por videoconferência, e de testemunhas convidadas. Ainda não há data marcada para as reuniões. As regras foram acordadas entre ele e o deputado Diego Garcia (Republicanos-PR), relator da ação.

Zambelli foi condenada a dez anos de prisão pela invasão ao sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Os ministros também determinaram a perda do cargo na Câmara dos Deputados. Dias após a sentença, a deputada deixou o Brasil e seguiu para os Estados Unidos, onde anunciou que não voltaria ao País. Dias depois, fugiu para Itália, onde possui dupla cidadania na crença de que seria poupada de cumprir pena.

O hacker Walter Delgatti Neto, condenado a 8 anos e 3 meses de reclusão por invadir sistemas da Justiça brasileira com Zambelli, será convidado pelos deputados para audiência.

A defesa da deputada apresentou pedido de acareação entre ela e o hacker como meio necessário para "dirimir eventuais contradições e confrontar as versões apresentadas". No informativo desta terça-feira, os deputados esclareceram que indeferiram o pedido da confrontação entre as testemunhas, por "ausência de previsão regimental".

Além de Delgatti, Flávio Vieitez Reis e Felipe Monteiro de Andrade, delegado e agente da Polícia Federal (PF), respectivamente, que trabalharam no caso, também serão ouvidos pelos parlamentares, caso aceitem participar das oitivas.

O ex-ministro da Defesa de Jair Bolsonaro (PL) que se encontrou com Delgatti, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, também será convidado, assim como Michel Spiero, assistente técnico de defesa de Zambelli que atuou na ação penal do Supremo Tribunal Federal (STF) que condenou a deputada.

A CCJC é responsável por analisar o processo de cassação e emitir parecer favorável ou contrário à perda de mandato. Em caso de parecer positivo, o processo segue para votação no plenário da Câmara. São necessários os votos de 257 deputados para que a cassação se concretize.