Bancada evangélica blinda Mendonça e culpa Moraes por morte de preso bolsonarista na Papuda

Política
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Deputados da bancada evangélica têm blindado o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) André Mendonça e atribuído ao também ministro da Corte Alexandre de Moraes a responsabilidade pela morte de Cleriston Pereira da Cunha, manifestante bolsonarista preso no 8 de Janeiro e morto na última segunda-feira, 20, vítima de um mal súbito no presídio da Papuda, em Brasília.

A defesa de Cleriston havia apresentado em fevereiro um habeas corpus pedindo que ele fosse colocado em liberdade. O caso foi distribuído para Mendonça, que negou o pedido com base em argumentos técnicos - de acordo com a jurisprudência do Supremo, um ministro não pode, sozinho, derrubar a decisão de outro. O mérito não chegou a ser apreciado.

A prisão preventiva foi decretada por Alexandre de Moraes, que é o relator da ação penal. Em setembro, a Procuradoria-Geral da República (PGR) pediu a liberdade de Cleriston, mas o ministro não chegou a analisar o pedido. De acordo com o advogado do manifestante, ele possuía problemas de saúde provocados por sequelas da covid-19. Ainda não se sabe se essa é a causa da morte.

"O único culpado dessa história é Alexandre de Moraes", afirmou o deputado federal Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), vice-presidente da frente parlamentar evangélica e 2º vice-presidente da Câmara. Ele defende que a decisão do habeas corpus foi "técnica" e "consolidada" pelos precedentes do STF. "É uma grande estratégia da esquerda para querer manchar André Mendonça", disse o parlamentar.

Dono de um perfil discreto, o ex-advogado-geral da União foi indicado ao Supremo por Jair Bolsonaro (PL) em 2021, como forma de cumprir a promessa de colocar um ministro "terrivelmente evangélico" na Corte. Por outro lado, Moraes, relator dos inquéritos contra o ex-presidente e também de todas as ações penais vindas do 8 de Janeiro, é um alvo constante de bolsonaristas. Entre os colegas de toga, ele é o campeão de pedidos de impeachment, sendo alvo de 40 processos parados no Senado.

Outra liderança evangélica na Câmara, Eli Borges (PL-TO) afirma que, no caso de Cleriston, "a competência de soltar ou prender é de Alexandre de Moraes. Mendonça apenas disse que não era dele a competência". Para o deputado, que é vice-presidente da bancada evangélica, o manifestante que morreu nesta semana "foi vítima da ausência de procedimentos de quem deveria analisar o processo, o pedido dos advogados e o pedido da PGR".

Depois que Cleriston foi enterrado, a deputada Bia Kicis (PL-DF), que também é evangélica, prometeu em discurso na Câmara um novo pedido de impeachment contra Moraes. Até o momento, não há registro desse requerimento no site do Senado. A parlamentar disse que o ministro "prevaricou" ao não ter avaliado o parecer da PGR pela soltura do manifestante.

O pastor Silas Malafaia fez diversas publicações nas redes sociais dizendo que Moraes é responsável pela manutenção da prisão de Cleriston. Nesta quinta-feira, 23, ele publicou um vídeo defendendo o argumento técnico da decisão de Mendonça que rejeitou o habeas corpus e afirmando que haveria uma "manipulação" da esquerda para livrar Moraes.

Apesar de nunca ter possuído um cargo eletivo, Malafaia é uma liderança forte da política nacional. Em 2002, na primeira vez em que Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi candidato, o pastor fez campanha para ele. Nos últimos anos, ele mudou de lado e hoje é um defensor fiel de Bolsonaro.

Vinicius do Valle, doutor em Ciência Política pela USP e diretor do Observatório Evangélico, avalia que a proximidade do setor com Mendonça não é uma casualidade momentânea. "Pela ligação que ele tem com os evangélicos, eles defendem a sua figura, defenderam a sua indicação e acabam blindando esse ministro das críticas mais extremistas", diz o diretor.

Ele afirma que tanto os bolsonaristas quanto os evangélicos são bases "multifacetadas" e que a proteção a Mendonça é um "movimento constante". Para o cientista político, "tanto ele quanto Kassio Nunes Marques, que são os ministros indicados por Bolsonaro, têm posições mais próximas a esse grupo (evangélicos), são mais conservadores e têm votos mais alinhados com a ideologia bolsonarista".

Especialistas falam que culpar um ministro ou outro 'polariza' e 'empobrece' a discussão

De acordo com a advogada Luiza Oliver, mestre em Direito Penal pela New York University e conselheira da OAB São Paulo, tentar culpar um ministro ou outro pela morte de Cleriston "empobrece" a discussão que o caso dele levanta sobre sistema carcerário no Brasil.

Detentos que estavam perto do bolsonarista no momento do óbito dizem que ele demorou 40 minutos para ser atendido e que dentro da Papuda não há desfibrilador nem cilindro de oxigênio, itens essenciais para um atendimento de emergência. "Há uma reflexão muito maior que precisamos fazer sobre o sistema de Justiça, o encarceramento, como o Estado lida com ele. Todo mundo precisa ser colocado na cadeia mesmo?", questionou a advogada.

A regra que Mendonça usou para negar o habeas corpus é um entendimento do STF de que um ministro, sozinho, não pode derrubar a decisão de outro ministro. Por isso, como explica a advogada, apenas o próprio Moraes ou o plenário do Tribunal poderiam por Cleriston em liberdade. Qualquer outro ministro que tivesse recebido o habeas corpus, segundo ela, teria decidido da mesma maneira.

Para o cientista político e professor da FGV Marco Antonio Carvalho Teixeira, essa tentativa de culpar Moraes e blindar Mendonça "é rescaldo da polarização". Segundo ele, opositores do Supremo usam um "roteiro de respostas prontas" para desgastar Moraes.

Além disso, ele afirma que a retomada do protagonismo de Bolsonaro por meio da eleição do novo presidente argentino, Javier Milei, infla os grupos que se opõem ao STF "a darem a cara a bater novamente". "Os grupos afetados pelo 8 de Janeiro se colocam publicamente como injustiçados e vítimas. A tentativa de golpe aconteceu", disse o professor.

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Lilian Moreno Cuéllar, juíza distrital de Santa Cruz de la Sierra, na Bolívia, anulou nesta quarta, 30, a ordem de captura contra o ex-presidente Evo Morales por estupro e tráfico de pessoas, em um caso relacionado ao abuso de uma menor durante seu mandato. "Fica sem efeito qualquer mandado de rebeldia e ordem judicial de apreensão", diz a decisão judicial.

Lilian também determinou a suspensão de qualquer investigação sobre o caso, que corre em Tarija, no sul da Bolívia, e ordenou que o processo seja enviado para Cochabamba - onde Evo tem forte respaldo político e social.

Em outubro, o Ministério Público havia pedido a prisão do ex-presidente boliviano, de 65 anos, que desde então se refugiou em seu bastião político na região cocaleira do Chapare. De acordo com o MP, Evo começou um relacionamento com uma jovem de 15 anos em 2015, quando ele era presidente, e os pais dela consentiram com a união em troca de benefícios. A relação resultou no nascimento de uma filha, um ano depois. A jovem foi posteriormente identificada como Noemí Meneses, que hoje estaria com 25 anos.

Reação

A ordem judicial provocou reação dos críticos de Evo, em razão do histórico de Lilian, que entre 2012 e 2016 trabalhou no Serviço Nacional de Impostos e depois na Companhia Ferroviária Nacional (Enfe).

Lilian foi nomeada juíza pouco antes de Evo deixar o poder, em 2019, o que acabou levantando questionamentos sobre um conflito de interesses e acusações de proteção política ao ex-presidente boliviano.

Evo está inelegível desde 2023, quando a Justiça eleitoral vetou a reeleição indefinida - Evo foi presidente por quatro mandatos. Em fevereiro, no entanto, ele desafiou a sentença e anunciou sua candidatura presidencial nas eleições de 17 de agosto.

Ele se tornou opositor do atual presidente Luis Arce, transformado em desafeto e chamado de "traidor", depois que ambos desataram uma guerra pelo controle do partido Movimento ao Socialismo (MAS). Em março, o ex-presidente fundou seu próprio partido, o Evo Povo. (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

O jornalista sueco Joakim Medin, preso em março após sua chegada à Turquia, foi condenado ontem a 11 meses de prisão por "insultar o presidente" turco, Recep Tayyip Erdogan, durante um protesto ocorrido em Estocolmo. A condenação foi suspensa logo em seguida, mas ele continuará detido por outra acusação, a de "pertencer a uma organização terrorista".

O repórter do jornal sueco Dagens ETC participou da audiência por videoconferência de sua cela na prisão de Silivri, oeste de Istambul. A Justiça turca o acusa de ter participado, em janeiro de 2023, de uma manifestação do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK) em Estocolmo, capital sueca, durante a qual foi pendurado um boneco de Erdogan de cabeça para baixo, algo que o jornalista nega desde o início.

Medin reafirmou nesta quarta, 30, "não ter participado desse evento". "Eu estava na Alemanha a trabalho. Nem sabia dessa manifestação", declarou. Durante a audiência, o tribunal exibiu fotos tiradas em outra reunião, em agosto de 2023, em Estocolmo, quando a Turquia ainda bloqueava a entrada da Suécia na Otan.

"Nunca tive a intenção de insultar o presidente. Eu tinha a tarefa de escrever os artigos, e foram meus editores que escolheram as fotos", disse o repórter, destacando que Erdogan é "uma figura central" exibida nesses protestos.

Medin, de 40 anos, foi preso em 27 de março ao chegar à Turquia, onde iria cobrir as manifestações desencadeadas pela prisão, em 19 de março, do prefeito de Istambul, Ekrem Imamoglu, principal adversário político do presidente.

Violações

O jornalista relatou múltiplas violações de seus direitos básicos durante os estágios iniciais de sua detenção, incluindo o direito de acesso a um tradutor, a um advogado e a serviços consulares. Medin foi acusado de pertencer a uma organização terrorista, crime que poderia lhe render até nove anos de prisão e será julgado posteriormente, em data a ser definida.

Essa acusação baseia-se em publicações nas redes sociais, artigos e livros escritos "unicamente no âmbito de seu trabalho jornalístico", disse Baris Altintas, diretora da ONG turca de direitos humanos MLSA, que o representa. (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

A Polícia Federal prendeu nesta quarta-feira, 30, o empresário turco naturalizado brasileiro Mustafa Goktepe. Integrante do movimento Hizmet, que faz oposição ao governo do presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, ele é alvo de um pedido de extradição do governo da Turquia. A prisão ocorreu após autorização do Superior Tribunal Federal, em decisão tomada pelo ministro Flávio Dino.

A Constituição Federal de 1988, no entanto, só permite a extradição de brasileiros naturalizados em duas situações: crime comum cometido antes da naturalização e envolvimento comprovado em narcotráfico. O STF tem considerado que crimes de terrorismo podem ser equiparados a crimes políticos, dificultando os processos.

O pedido de prisão de Goktepe chegou via Ministério da Justiça, pelo canal protocolar. Beto Vasconcelos, advogado do empresário turco, em entrevista ao Estadão, no entanto, alega que a tentativa de golpe é de 2016, quando ele já era cidadão brasileiro. Portanto, de acordo com o entendimento da defesa, o STF deve negar o pedido de extradição.

Em sua decisão, porém, Dino afirma que o pedido do governo turco cumpre os requisitos exigidos pela lei de migração brasileira, como a apresentação de documentos que identificam o acusado, descrevem os fatos e atestam a ordem judicial emitida pela Turquia. O ministro diz ainda que não há impedimentos legais para a extradição: "ele não é brasileiro, não responde por crime político ou de opinião" - Dino não menciona o fato de ele ser naturalizado desde 2012.

Após a prisão, Goktepe foi levado para a Superintendência da Polícia Federal em São Paulo. O empresário reside no Brasil desde 2004, é dono de uma rede de restaurantes turcos e professor visitante da Universidade de São Paulo (USP).

Perseguição política

A defesa de Goktepe entrou com pedido para revogar a prisão e disse ter confiança de que a extradição será negada pelo STF, como aconteceu anteriormente com os empresários de origem turca Ali Sipahi e Yakup Sagar, também ligados ao Hizmet.

Vasconcelos criticou o uso da extradição para perseguição política. "Esse pedido de extradição não tem fundamento fático nem jurídico. Mustafa Goktepe mora no Brasil há mais de 20 anos, é brasileiro naturalizado há 12 anos, casado com uma brasileira, tem filhas brasileiras, é um empresário que não tem absolutamente nenhuma acusação de conduta equivocada", disse.

Vasconcelos alega que há precedentes para revogar a prisão e negar a extradição. "É mais um triste caso de perseguição política, de risco de submissão a tribunais de exceção em um país com registro de graves violações dos direitos humanos."

Acusado de tramar uma tentativa de golpe contra Erdogan, em 2016, o Hizmet é alvo de perseguição pelo governo da Turquia, que classifica a organização como "terrorista". O movimento foi criado pelo clérigo Fethullah Gülen, que morreu no ano passado nos EUA, onde havia se exilado.

Expurgos

Gülen defendia uma visão mais moderada do islamismo e tinha seguidores por todo o mundo. Até 2013, ele foi aliado de Erdogan, então primeiro-ministro da Turquia. Na ocasião, o premiê havia se envolvido em um escândalo de corrupção e se voltou contra o Hizmet. O rompimento ocorreu porque as denúncias foram motivadas por investigações de promotores ligados ao grupo.

Após a tentativa de golpe, o governo de Erdogan iniciou uma repressão brutal contra civis e militares, realizando um expurgo de milhares de pessoas. Ao todo, mais de 45 mil militares, policiais, governadores e funcionários públicos foram detidos ou suspensos, incluindo 2,7 mil juízes, 15 mil professores e todos os reitores de universidades do país. Nenhum país a não ser a Turquia qualifica o Hizmet como terrorista.

A Turquia é considerada um país "não livre" pela Freedom House, ONG que monitora a democracia no mundo. Erdogan e seu Partido da Justiça e Desenvolvimento (AKP), segundo a organização, tornaram-se cada vez mais autoritários, acumulando poder com mudanças constitucionais e prisão de opositores.

Erdogan está no poder desde 2003, entre mandatos de primeiro-ministro e presidente. Ele conta com apoio de setores conservadores e religiosos, mas seus críticos o acusam de usar os poderes do Estado para suprimir a dissidência.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.