STF autoriza e PF prende opositor de Erdogan com cidadania brasileira

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A Polícia Federal prendeu nesta quarta-feira, 30, o empresário turco naturalizado brasileiro Mustafa Goktepe. Integrante do movimento Hizmet, que faz oposição ao governo do presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, ele é alvo de um pedido de extradição do governo da Turquia. A prisão ocorreu após autorização do Superior Tribunal Federal, em decisão tomada pelo ministro Flávio Dino.

A Constituição Federal de 1988, no entanto, só permite a extradição de brasileiros naturalizados em duas situações: crime comum cometido antes da naturalização e envolvimento comprovado em narcotráfico. O STF tem considerado que crimes de terrorismo podem ser equiparados a crimes políticos, dificultando os processos.

O pedido de prisão de Goktepe chegou via Ministério da Justiça, pelo canal protocolar. Beto Vasconcelos, advogado do empresário turco, em entrevista ao Estadão, no entanto, alega que a tentativa de golpe é de 2016, quando ele já era cidadão brasileiro. Portanto, de acordo com o entendimento da defesa, o STF deve negar o pedido de extradição.

Em sua decisão, porém, Dino afirma que o pedido do governo turco cumpre os requisitos exigidos pela lei de migração brasileira, como a apresentação de documentos que identificam o acusado, descrevem os fatos e atestam a ordem judicial emitida pela Turquia. O ministro diz ainda que não há impedimentos legais para a extradição: "ele não é brasileiro, não responde por crime político ou de opinião" - Dino não menciona o fato de ele ser naturalizado desde 2012.

Após a prisão, Goktepe foi levado para a Superintendência da Polícia Federal em São Paulo. O empresário reside no Brasil desde 2004, é dono de uma rede de restaurantes turcos e professor visitante da Universidade de São Paulo (USP).

Perseguição política

A defesa de Goktepe entrou com pedido para revogar a prisão e disse ter confiança de que a extradição será negada pelo STF, como aconteceu anteriormente com os empresários de origem turca Ali Sipahi e Yakup Sagar, também ligados ao Hizmet.

Vasconcelos criticou o uso da extradição para perseguição política. "Esse pedido de extradição não tem fundamento fático nem jurídico. Mustafa Goktepe mora no Brasil há mais de 20 anos, é brasileiro naturalizado há 12 anos, casado com uma brasileira, tem filhas brasileiras, é um empresário que não tem absolutamente nenhuma acusação de conduta equivocada", disse.

Vasconcelos alega que há precedentes para revogar a prisão e negar a extradição. "É mais um triste caso de perseguição política, de risco de submissão a tribunais de exceção em um país com registro de graves violações dos direitos humanos."

Acusado de tramar uma tentativa de golpe contra Erdogan, em 2016, o Hizmet é alvo de perseguição pelo governo da Turquia, que classifica a organização como "terrorista". O movimento foi criado pelo clérigo Fethullah Gülen, que morreu no ano passado nos EUA, onde havia se exilado.

Expurgos

Gülen defendia uma visão mais moderada do islamismo e tinha seguidores por todo o mundo. Até 2013, ele foi aliado de Erdogan, então primeiro-ministro da Turquia. Na ocasião, o premiê havia se envolvido em um escândalo de corrupção e se voltou contra o Hizmet. O rompimento ocorreu porque as denúncias foram motivadas por investigações de promotores ligados ao grupo.

Após a tentativa de golpe, o governo de Erdogan iniciou uma repressão brutal contra civis e militares, realizando um expurgo de milhares de pessoas. Ao todo, mais de 45 mil militares, policiais, governadores e funcionários públicos foram detidos ou suspensos, incluindo 2,7 mil juízes, 15 mil professores e todos os reitores de universidades do país. Nenhum país a não ser a Turquia qualifica o Hizmet como terrorista.

A Turquia é considerada um país "não livre" pela Freedom House, ONG que monitora a democracia no mundo. Erdogan e seu Partido da Justiça e Desenvolvimento (AKP), segundo a organização, tornaram-se cada vez mais autoritários, acumulando poder com mudanças constitucionais e prisão de opositores.

Erdogan está no poder desde 2003, entre mandatos de primeiro-ministro e presidente. Ele conta com apoio de setores conservadores e religiosos, mas seus críticos o acusam de usar os poderes do Estado para suprimir a dissidência.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, disse nesta sexta-feira, 1º, que o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, pode falar com ele quando quiser. A declaração foi dada na Casa Branca, em resposta à jornalista Raquel Krähenbühl, da TV Globo e da GloboNews.

Trump foi questionado diretamente sobre se estava disposto a discutir as tarifas aplicadas ao País e reafirmou que Lula pode falar com ele, repetindo a mesma frase: "Ele pode falar comigo quando quiser". Na sequência, ao ser perguntado sobre o que estaria em pauta para o Brasil, completou: "Vamos ver o que acontece. Eu amo o povo brasileiro".

Ao ser indagado sobre o fato de as tarifas impostas ao Brasil não parecerem ter ligação com questões comerciais, Trump afirmou que "as pessoas que governam o Brasil fizeram a coisa errada".

Em meio às pressões para que Lula entre em contato com o norte-americano e discuta o tarifaço de 50% imposto aos produtos brasileiros comercializados com aquele país, integrantes do governo Lula vinham enfatizando que a organização de uma conversa entre os dois presidentes era complexa e não poderia ocorrer de "improviso".

Como mostrou o Estadão, Lula cogita ligar para Trump, mas queria antes ter a certeza de que o americano iria atender a ligação e focar em comércio na conversa - ou seja, o petista não vai dar margem a negociar assuntos institucionais e de soberania.

Há receio no Palácio do Planalto de que ele seja submetido a algum tipo de constrangimento político ou humilhação, mesmo por telefone ou videochamada.

Em entrevista ao The New York Times, o mandatário brasileiro afirmou que o País "não negociará como se fosse um país pequeno contra um país grande". O próprio Lula disse que deseja ser tratado com respeito e civilidade.

Ambos têm um histórico de declarações hostis mútuas no passado e jamais interagiram ou se encontraram pessoalmente. Integrantes do governo dizem que movimentos exploratórios, que podem ajudar a preparar o terreno para um contato no mais alto nível estão em curso.

O estreitamento de contatos entre equipes de governo faz parte desse processo. Na quarta-feira, dia 30, pela primeira vez o ministro Mauro Vieira (Relações Exteriores) conversou com o secretário de Estado, Marco Rubio, em encontro discreto em Washington, fora do Departamento de Estado e da embaixada brasileira.

Os contatos mais frequentes têm sido feitos pelo vice-presidente Geraldo Alckmin, também ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços. A equipe dele trabalha com expectativa de novos contatos, em nível técnico e político.

Na última quarta-feira, 30, o presidente americano assinou a ordem que define a tarifa adicional de 40% sobre o Brasil (além dos 10% inicialmente aplicados como tarifa recíproca), apontando especialmente razões políticas em seu comunicado, com ataques ao governo brasileiro e ao ministro Alexandre de Moraes, em razão do julgamento de Jair Bolsonaro e da regulação das big techs. Apesar disso, quase 700 produtos brasileiros foram isentos da tarifa.

Contatos entre os governos Lula e Trump:

- Videoconferência entre Geraldo Alckmin e Howard Lutnick (Secretário de Comércio) em 6/3

- Reuniões virtuais entre Mauro Vieira e Jamieson Greer (USTR) em 6/3 e 2/4

- Encontro presencial entre Fernando Haddad e Scott Bessent (Secretário do Tesouro) em 4/5 na Califórnia

- Encontro presencial entre Mauro Vieira e Marco Rubio (Secretário de Estado) em 30/7 na capital Washington

- Viagem do embaixador Maurico Lyrio e equipe da Secretaria de Assuntos Econômicos e Financeiros a Washington em março

- Seis reuniões de negociação tarifária entre técnicos e diplomatas de 8/3 a 4/7

A Procuradoria-Geral da República pediu ao Supremo Tribunal Federal que ordene a suspensão de todas as ações judiciais abastecidas com informações de inteligência do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) sem expressa autorização judicial. Segundo a PGR, o Superior Tribunal de Justiça adota um "desvio interpretativo" do entendimento do STF, restringindo o uso dos Relatórios de Inteligência Financeira (RIFs) do Coaf pelos órgãos de investigação.

Segundo o procurador-geral Paulo Gonet, as decisões conflitantes sobre a possibilidade de troca de informações podem causar "graves consequências ao enfrentamento do crime no país, em especial ao crime organizado e à criminalidade financeira".

"Há notícia de dezenas de inquéritos policiais trancados, centenas de prisões revogadas, milhões de reais em medidas patrimoniais anuladas e operações policiais invalidadas", alerta Gonet.

O uso do RIF sem prévia decisão judicial tem sido objeto de uma série de questionamentos no Judiciário sobre a validade de investigações de combate ao crime organizado. Para o procurador-geral, a jurisprudência do STF já consolidou a possibilidade de troca de informações de inteligência financeira pelos órgãos de investigação, como a Polícia Federal e o Coaf, no julgamento do tema de repercussão geral 990.

"A Suprema Corte ressaltou a importância do intercâmbio de informações para o combate à criminalidade organizada e à corrupção, sobretudo em relação aos crimes de sonegação fiscal, evasão de divisas e lavagem de dinheiro", declarou Gonet.

O procurador requereu a suspensão de todos os questionamentos sobre o uso do RIF sem decisão judicial, ao considerar que o STJ adota um "padrão recorrente de desvio interpretativo da jurisprudência estabelecida pelo STF naquele precedente vinculante".

"O STJ, ao cogitar que a expressão 'procedimento formalmente instaurado' corresponde, estrita e unicamente, à instauração de inquérito policial, bem como que a requisição dos relatórios pelo Ministério Público impõe prévia autorização judicial, tem desbordado dos limites da decisão tomada pelo STF na sistemática da Repercussão Geral", destacou o pedido.

Para o PGR, além do risco de novas decisões baseadas no entendimento do STJ, há a possibilidade de que decisões já proferidas possam impactar o andamento futuro de investigações e inquéritos, "o que geraria insegurança jurídica e grave impacto em todo o sistema de justiça".

"A manifestação é pela determinação de suspensão nacional de todos os processos pendentes que versem sobre a questão discutida no Tema n. 1.404 da Repercussão Geral", concluiu Gonet.

Pescaria probatória

Para Priscila Pamela, advogada criminal e vice-presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa, a manifestação da PGR vai no "sentido de alargar o conceito de procedimento de investigação formal, permitindo o que hoje os tribunais, em decisões conflitantes, têm por vezes entendido como sendo fishing expedition, e o mérito de tal pretensão precisa ser afastado".

Pamela considera essencial uma uniformização dos critérios para o compartilhamento de informações financeiras pelo Coaf, mas ressalta que é necessário regular "o compartilhamento de relatórios entre o Conselho e as autoridades investigativas, para que seja autorizado apenas em hipóteses restritas em que haja, de fato, formalmente, um procedimento investigativo já instaurado, sob pena de quebra da excepcionalidade de violação do sigilo bancário de pessoas investigadas".

A presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministra Cármen Lúcia, afirmou que o ministro Alexandre de Moraes, ex-presidente da Corte, será sempre lembrado por sua atuação nas eleições de 2022, "em um momento que ainda repercute a situação de extrema dificuldade em que ele atuou e continua atuando como ministro do Supremo Tribunal Federal, com os rigores da lei".

Na retomada dos trabalhos da Justiça Eleitoral, após o recesso de julho, a ministra iniciou a sessão com um discurso protocolar, mencionando a preparação para o próximo pleito. "Essa Justiça Eleitoral segue trabalhando nos termos do direito vigente no Brasil, com tranquilidade, ética, imparcialidade e independência, agora de uma forma muito mais objetivada, focando as eleições de 2026", declarou.

Cármen Lúcia não citou diretamente o caso das sanções do governo Trump ao ministro Alexandre de Moraes, mas, ao longo de sua fala, fez destaque à "soberania das leis do Brasil", com uma breve menção ao colega ministro do Supremo Tribunal Federal:

"Essa Justiça Eleitoral segue fazendo o seu dever: observar e aplicar a Constituição do Brasil, as leis da República Brasileira, como fizeram os magistrados que nos antecederam nestas cadeiras. Aqui faço uma ênfase especial a quem sucedo na presidência, o ministro Alexandre de Moraes, cujo papel na história será sempre lembrado, especialmente na atuação nas eleições de 2022."

A ministra foi a única a fazer menção a Moraes.

O TSE é composto por três ministros do STF, dois do Superior Tribunal de Justiça e dois advogados. Além de Cármen Lúcia, representam o Supremo os ministros Kassio Nunes Marques, vice-presidente da Corte, e André Mendonça - indicados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Logo após o discurso inicial, foi realizada a posse dos ministros Floriano de Azevedo Marques e Estela Aranha, que assumiram as vagas destinadas à advocacia.