Eleições na Argentina: Buenos Aires, a cidade que escolheu Bullrich e rejeita Milei

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Damian Ernesto tem 53 anos e esta será a primeira vez que votará em alguém que verdadeiramente o agrade. O motorista de táxi de Buenos Aires, na Argentina, é um admirador da linha-dura Patricia Bullrich e confia na mudança que ela promete trazer sem "explodir tudo", como afirma que quer fazer o libertário Javier Milei.

A cidade portenha foi uma das poucas que não se pintou inteira de violeta, cor da coalizão A Liberdade Avança, de Milei, como ocorreu em quase todo o país durante as eleições primárias de agosto. A capital argentina, que concentra o maior eleitorado do país, ainda mantém uma certa fidelidade com o Juntos pela Mudança, coalizão de Bullrich, ainda que na província de Buenos Aires quem se saia melhor seja o governo do peronista Sergio Massa.

Buenos Aires serve como uma vitrine para a gestão da coalizão opositora ao governo. Seu líder, o ex-presidente Mauricio Macri, foi prefeito da cidade antes de se lançar nacionalmente. Um caminho que é natural dentro do Proposta Republicana (PRO), seu partido. Esperava-se que o mesmo ocorresse com Horacio Rodríguez Larreta, que é o atual prefeito e tentou ser candidato a presidente. Mas frente ao sentimento de cansaço do argentino, foi Bullrich com seu discurso de segurança que ganhou a vaga nas eleições primárias.

Nem Milei nem o peronismo conseguem até o momento adentrar a disputa portenha. "O eleitorado da cidade de Buenos Aires é um eleitorado que há muitos anos vota na aliança entre o PRO, a União Cívica Radical e a Coalizão Cívica, que formam o Juntos pela Mudança", explica o professor de Ciência Política da Universidade de Buenos Aires, Facundo Galván. "Os setores médios não estão inclinados a votar opções peronistas ou opções outsiders. Historicamente, a capital federal foi um eleitorado radical, mais progressista e mais de classe média."

"A cidade de Buenos Aires é o setor dos conservadores, nunca foi governada pelo peronismo, sempre foi governada pelos partidos conservadores e sempre esteve mais associada aos setores do radicalismo, depois ao PRO quando surgiu como um partido", concorda o cientista político e sociólogo Sebastián Cruz Barbosa.

Basta caminhar nas ruas de Buenos Aires, especialmente das regiões de Palermo e Recoleta, para encontrar alguém que admira Bullrich. No caso de Ernesto, sempre votou pela oposição e jamais votaria em um peronista, mas via em Larreta o "mais do mesmo", reflexo do cansaço com a política tradicional.

Já Bullrich, por mais que venha de uma das famílias mais tradicionais da política argentina, conquista o eleitorado que quer uma mudança, mas sem apelar à explosão do Banco Central, afirma.

Consolidando esta preferência pelo Juntos pela Mudança na cidade, Jorge Macri, primo de Mauricio Macri é o favorito para vencer a disputa para a prefeitura, sendo seguido por Leandro Santoro, do peronismo, e Ramiro Marra, candidato de Milei.

Cidade conservadora, província peronista

Nas PASO (Primárias, Abertas, Simultâneas e Obrigatórias), o Juntos pela Mudança levou a cidade de Buenos Aires com 48% dos votos. Já o União pela Pátria aparece com 23,6% e só então vem Javier Milei, com 17%. Já na província, a coalizão peronista levou a melhor com 32% dos votos, seguidos pela oposição com 29% e A Liberdade Avança com 24%.

Em termos provinciais, quem sai ganhando é o peronismo. "O peronismo sempre teve mais chances de vencer na província de Buenos Aires porque é o bastião tradicional, ou seja, o fenômeno do peronismo, que é um fenômeno dos anos 1940 na Argentina, nasceu com a gestação da classe trabalhadora da Argentina e com a classe trabalhadora das indústrias urbanas, principalmente da província de Buenos Aires", explica Barbosa, que estuda o peronismo.

Mas esta eleição da província, dada certa para o peronista Axel Kicillof, pode estar em risco frente a um escândalo dentro da cúpula do seu governo. Seu então chefe de gabinete, Martín Insaurralde, foi flagrado ostentando uma vida de luxo ao lado de uma modelo na Espanha, na mesma semana em que saíram os novos dados de pobreza que mostravam mais de 40% da população abaixo dessa linha.

O escândalo abalou a campanha de Massa, que pediu publicamente a cabeça do kirchnerista. No fim, Insaurralde desistiu de sua campanha para a prefeitura de Lomas de Zamora, cidade da grande Buenos Aires, e do seu cargo com Kicillof. Mas o atual governador foi criticado por não ter sido ele a despedir o funcionário.

O caso acirrou os ânimos dentro do peronismo, especialmente entre Kicillof e o grupo jovem chamado de La Cámpora, encabeçado por Máximo Kirchner, filho de Cristina Kirchner. Há tempos que os dois se estranham, mas depois do escândalo, Cristina precisou intervir diretamente para evitar uma cisão dentro da coalizão que poderia provocar a histórica derrota na província.

Até o momento, as pesquisas não mostraram um impacto forte do caso nas intenções de voto de Kicillof. Além dele, concorrem pela província: Néstor Grindetti, do Juntos pela Mundança, e Carolina Píparo, do A Liberdade Avança.

Milei em Buenos Aires

O que fica clara é a dificuldade de Milei em entrar neste gigantesco eleitorado. Segundo Galván, o fato de não possuir um poder político consolidado e nem um aparato de partido, explica porque Milei não consegue levar nem a cidade e nem a província de Buenos Aires. O Juntos pela Mudança entrou na corrida com o maior orçamento e os peronistas têm a vantagem de ter a máquina estatal a favor.

"A província de Buenos Aires concentra 37% do padrão eleitoral apenas na área suburbana, onde o aparato político do Partido Justicialista é o mais relevante porque é onde está mais consolidado", explica o professor da UBA.

"Já Milei não tem aparato fiscalizador, pelo menos não teve nas PASO e não tem referências fortes nas prefeituras dos subúrbios e isso também não o ajuda a ganhar muitos votos, teve sucesso com relativamente poucos dos mais 130 prefeitos que concorrem na província de Buenos Aires, a maioria são figuras desconhecidas ou que romperam com o peronismo, então isso também ajuda a entender um pouco o seu desempenho fraco aqui nas primárias, temos que ver o que acontece no geral eleições", completa.

Na intenção de vencer já em primeiro turno, Javier Milei encerra sua campanha justamente na província de Buenos Aires, tendo inclusive passado pela cidade de Martín Insaurralde, Lomas de Zamora, nesta segunda-feira, 16.

"Estamos a poucos pontos de vencer no primeiro turno e para conseguir precisamos do apoio de todos aqueles que querem uma mudança", disse o candidato durante sua caravana que tem percorrido o país. "Na província de Buenos Aires temos a oportunidade histórica de vencer o kirchnerismo e eliminá-los para sempre".

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O governo Lula rechaçou a sondagem feita pela administração Trump para categorizar o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV), as duas maiores facções criminosas do País, como organizações terroristas.

A opção foi sugerida durante uma reunião na tarde desta terça-feira, 6, em Brasília, entre autoridades do Brasil e uma comitiva liderada por David Gamble, chefe interino da coordenação de sanções do Departamento de Estado americano. Servidores dos ministérios das Relações Exteriores e da Justiça e Segurança Pública e da Polícia Federal participaram do lado brasileiro.

Os enviados da Casa Branca alegaram, segundo relatos de pessoas envolvidas, que a legislação americana permitiria sanções mais pesadas contra PCC e CV se eles fossem enquadrados como terroristas pelo governo do Brasil. Isso porque o sistema penal dos Estados Unidos é mais duro com esse tipo de atividade.

Gamble e sua comitiva também mencionaram que o FBI (a Polícia Federal americana) avalia que o PCC e o CV estão presentes em 12 estados americanos, como Nova York, Flórida, Nova Jersey, Massachussets, Connecticut e Tennessee.

As duas facções têm usado o território americano para lavar dinheiro, por meio de brasileiros que viajam ao País, de acordo com membros da comitiva de Trump. Eles citaram que 113 brasileiros tiveram visto negado pela Embaixada dos Estados Unidos após terem sido identificadas como ligadas às quadrilhas.

O argumento dado pelo governo brasileiro é que o sistema legal nacional não considera facções criminosas como terrorismo, uma vez que a atuação desses grupos não atendem a uma causa ou ideologia, mas sim a busca por lucro de diversas atividades ilícitas.

De volta à Casa Branca, o presidente Donald Trump tem colocado a preocupação com a entrada de imigrantes no País como sua principal batalha. No primeiro mês deste mandato, o republicano declarou emergência na fronteira e designou cartéis de drogas como organizações terroristas - o que ele agora quer fazer com as duas maiores quadrilhas brasileiras.

Autoridades brasileiras também argumentaram a Gamble que o Brasil tem se dedicado a implementar políticas públicas para combater facções como o PCC e o CV. O plano de fortalecer a integração com os demais países da América Latina foi mencionado no encontro.

Os presídios federais, onde governos têm isolado lideranças das cúpulas dessas quadrilhas, e operações feitas em conjunto pelas polícias e Ministérios Públicos - como, por exemplo, por meio dos Grupos de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco) - também foram foram colocados como exemplos.

Estavam presentes, além de Gamble, John Jacobs, da Embaixada dos Estados Unidos, o adido judicial Michael Dreher, os assessores sênior Ricardo Pita e John Johnson, a conselheira política Holly Kirking Loomis e o adido policial Shawn Sherlock. O ministério diz que o encontro foi feito a pedido dos americanos.

Na tarde da segunda-feira, 5, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) recebeu Pita em seu gabinete no Senado, também para tratar de crime organizado. Ele afirmou ter solicitado o encontro dias atrás com a Embaixada americana para tratar de segurança pública.

Nas redes sociais, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), entretanto, vinha tratando a vinda de Gamble como um passo para a imposição de sanções por parte de Trump contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, considerado algoz pelo bolsonarismo. Mas o assunto não foi discutido, de acordo com o senador.

Questionado sobre o fato de o próprio irmão ter sugerido nas redes sociais que o encontro seria feito para tratar de sanções a Moraes, Flávio negou a intenção. "Não, ele (Eduardo) está tratando disso nos Estados Unidos, mas esta reunião específica foi uma coincidência de verdade. Não vai ter outra (reunião) com a gente", declarou Flávio após a reunião.

O Supremo Tribunal Federal (STF) deve usar o julgamento da ação penal do "núcleo de desinformação" do plano de golpe para definir parâmetros mais claros de como punir fake news.

A Primeira Turma do STF recebeu nesta terça-feira, 6, por unanimidade, a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra sete aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) acusados de disseminar notícias falsas e ataques ao sistema eleitoral e a instituições e autoridades como parte do plano para mantê-lo no poder.

Uma ala do tribunal considera que essa é uma boa oportunidade para debater como enquadrar a divulgação de notícias falsas e se é possível tipificar as fake news como crime, mesmo sem uma lei específica que regulamente o assunto.

Na sessão desta terça, o ministro Flávio Dino defendeu a necessidade de reconhecer que as fake news são uma "modalidade de violência gravíssima" que tem causado "danos gravíssimos e incontornáveis similares a uma facada ou a um tiro".

Segundo Dino, esse reconhecimento precisa vir "pela via legislativa ou mesmo pela via jurisprudencial".

"Creio que temos esse encontro marcado, nesses autos e em outros, com a aquilatação adequada acerca desse juízo que cabe aos julgadores", defendeu.

"Em algum momento é preciso que haja essa compreensão social de que as fake news imbutem em si mesmas uma violência simbólica que extermina, que mata. Mata moralmente, mata psicologicamente, cria danos mentais, assassina reputações e leva ao terror dos alvos deste tipo de procedimento industrial que é uma das marcas terríveis do nosso tempo, que é a monetização do ódio, a monetização dessa violência simbólica por intermédio da tecnologia", concluiu Dino.

O ministro Alexandre de Moraes é outro que defende uma punição dura para a disseminação em massa de notícias falsas. Essa é uma das maiores bandeiras do ministro. Moraes já comprou briga com as redes sociais ao exigir mais controle sobre o conteúdo que circula nas plataformas.

Nesta terça, na sessão da Primeira Turma, Cármen Lúcia sinalizou que deve seguir a mesma linha dos colegas. "Quando a mentira se põe a serviço dos ódios, as consequências são muito pouco humanas e, principalmente, nunca serão democráticas", criticou a ministra.

A atualização do Marco Civil da Internet para punir a divulgação de notícias falsas está travada na pauta do Congresso. A iniciativa mais promissora foi o PL das Fake News, projeto de lei para regulamentar as redes sociais. A proposta foi retirada de pauta em 2023, após amplo lobby e pressão de grandes empresas de tecnologia, como Google e Telegram.

A Câmara dos Deputados aprovou, nesta terça-feira, 6, o requerimento de urgência para o projeto de lei que permite o aumento do número de vagas para deputados federais. No parecer do relator, deputado Damião Feliciano (União-PB), divulgado durante a tarde, haveria um acréscimo de 18 cadeiras. 268 deputados votaram a favor da urgência. Outros 199 parlamentares votaram contra a tramitação acelerada do texto.

O projeto altera a Lei Complementar nº 78 de 1993, que disciplina a fixação do número de deputados. A proposta do relator é estabelecer o número de 531 deputados a partir de 2026. Atualmente, a Câmara tem 513 deputados. O projeto prevê acréscimos para os seguintes Estados:

- Santa Catarina - Mais quatro cadeiras;

- Pará - Mais quatro cadeiras;

- Amazonas - Mais duas cadeiras;

- Rio Grande do Norte - Mais duas cadeiras;

- Mato Grosso - Mais duas cadeiras;

- Goiás - Mais uma cadeira;

- Ceará - Mais uma cadeira;

- Minas Gerais - Mais uma cadeira;

- Paraná - Mais uma cadeira;

Segundo o parecer, a distribuição das vagas terá como base os dados oficiais do censo demográfico realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com submissão dos dados ao Tribunal de Contas da União (TCU).

No documento, o relator sustenta que, segundo informações da Direção-Geral da Câmara, a criação das 18 vagas geraria um impacto anual de aproximadamente R$ 64,6 milhões. "Considerando a margem orçamentária estimada para o exercício de 2025, a Direção da Casa conclui que, mesmo hoje, o orçamento da Câmara dos Deputados já comportaria as despesas decorrentes da aprovação do projeto", alega o deputado.

No parecer, Damião Feliciano (União-PB) não detalha quais aspectos foram levados em consideração para o cálculo de que cada novo deputado geraria um custo anual de aproximadamente R$ 3,6 milhões.

A medida responde a uma determinação do Supremo Tribunal Federal (STF) para que o Congresso Nacional revise a distribuição do número de deputados, de acordo com a atual população de cada Estado.

A discussão partiu de uma ação do governo do Pará que argumenta que a distribuição dos 513 deputados federais foi estabelecida em 1993 e que, desde 2010, tem direito a mais quatro parlamentares. O STF, então, estabeleceu um prazo de até 30 de junho deste ano para que o Congresso dê uma solução à questão.

Caso a determinação não seja cumprida, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) poderá fixar o novo número de deputados federais e estaduais de cada Estado, além dos deputados do Distrito Federal, para a legislatura que se iniciará em 2027.

No caso, serão observados o piso e o teto constitucional por circunscrição, os dados demográficos coletados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no Censo de 2022 e a metodologia utilizada em resolução do TSE sobre o tema.