Lula diz que Trump tem de pensar como 'habitante do planeta Terra'

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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse nesta quinta-feira, 7, em entrevista à CNN dos EUA que Donald Trump precisa pensar como um habitante do planeta Terra ao tomar medidas relacionadas ao meio ambiente. Lula deu a declaração depois de questionado se achava que Trump tiraria os EUA do Acordo de Paris de novo, como fez em seu primeiro governo.

 

"O presidente Trump tem de pensar como um habitante do planeta Terra", disse Lula. Ele mencionou que os EUA são o país mais rico e mais poderoso do mundo, mas que isso não impede que os americanos também sofram as consequências das mudanças climáticas. "Ele está no mesmo planeta que eu estou."

 

Lula defendeu que todos tenham responsabilidade pela preservação do planeta, e mencionou a meta de aquecimento máximo de 1,5 grau Celsius, presente no Acordo de Paris. "Esse é um compromisso não só como presidente do Brasil, mas como ser humano de um planeta chamado Terra."

 

As declarações de Lula foram dadas no momento em que o governo brasileiro busca construir uma relação pragmática entre Lula e Trump. Em campos políticos opostos, eles têm um histórico de críticas um do outro. A vitória do americano com desempenho acachapante motivou cautela do Brasil.

 

Ligação

 

Membros do Palácio do Planalto e da chancelaria brasileira interpretam que tanto Lula quanto Trump já vestiram antes o figurino "pragmático" nas relações internacionais, ao exercerem a diplomacia presidencial. Eles acreditam que eles possam adotar um diálogo "produtivo", a despeito do choque ideológico.

 

Ao mesmo tempo, membros do governo brasileiro lembram que a relação de 200 anos os dois países ultrapassa a diplomacia presidencial, que as burocracias de Estado cooperam independentemente da amizade entre seus governantes. Há um intercâmbio de interesses privados, empresários e grupos de pressão, organizados em associações, que poderão destravar o diálogo.

 

Os EUA são o maior investidor externo no Brasil, com estoque de US$ 230 bilhões; o segundo maior parceiro comercial, com fluxo de US$ 75 bilhões, e abrigam a maior comunidade brasileira no exterior, com 2 milhões de pessoas.

 

Os contatos para estabelecer um canal entre ambos foram centralizados na diplomacia em Washington. Nos últimos meses a embaixada brasileira reforçou laços, buscou aproximação com os dois lados e acompanhou de perto a campanha. A embaixadora Maria Luiza Viotti participou pessoalmente da negociação e atua nos contatos com o comitê de Trump.

 

A expectativa do lado brasileiro é que um primeiro telefonema entre eles possa ocorrer dentro de algumas semanas. A interação será destravada depois que Trump indicar nomes e estabelecer poderes na sua equipe de transição, tanto na Casa Branca e quanto no Departamento de Estado.

 

Uma das maneiras de estreitar a relação foi o relançamento oficial, em fevereiro, da frente parlamentar Brasil-EUA no Congresso americano. Ela é copresidida pelo republicano Lance Gooden (Texas) e pela democrata Sydney Kamlager-Dove (Califórnia). Outro possível canal são as comissões de Relações Exteriores da Câmara e do Senado dos EUA, nas quais congressistas ligados a Trump são protagonistas.

 

Atritos

 

Em Brasília, diplomatas dizem que Lula já sinalizou disposição política com a mensagem felicitando Trump. Eles apostam que ambos terão interesse em manter uma boa relação. Eles lembram que nem com Joe Biden houve sempre concordância. Os EUA se irritaram, por exemplo, com declarações do petista comparando a ação militar de Israel em Gaza ao Holocausto. Além disso, Lula autorizou que dois navios de guerra iranianos, incluídos na lista de sanções dos EUA, aportassem no Rio, em 2023, apesar da pressão de Washington

 

No governo brasileiro, há quem lembre que Lula desenvolveu uma proximidade com o ex-presidente republicano George W. Bush, apesar dos embates geopolíticos entre eles. A diferença agora é que a oposição a Lula, exercida pelo bolsonarismo, tenta colar sua imagem em Trump, além de ter contado com o incentivo dele em 2022 - na ocasião, o republicano classificou o petista como "lunático" e recomendou voto em Jair Bolsonaro.

 

Outra possibilidade seria estender o convite à cúpula do G-20 no Rio a Trump ou um representante do futuro governo. Nesse caso, diplomatas destacam a necessidade de um entendimento entre Biden e Trump, similar ao que ocorreu no passado entre a ex-chanceler alemã Angela Merkel e seu sucessor, Olaf Scholz, durante a transição em Berlim.

 

Embora seja identificado como isolacionista e contra o multilateralismo, Trump sempre participou de todas as cúpulas do G-20 no seu primeiro mandato. Uma dificuldade é que a reunião será realizada em 18 e 19 de novembro, quando Trump ainda terá agenda doméstica intensa.

 

A palavra de ordem no governo brasileiro é tentar colocar as diferenças de lado e evitar provocações. O recado ficou explícito na mensagem oficial do presidente, publicada rapidamente em reconhecimento ao triunfo trumpista. "Meus parabéns ao presidente Donald Trump pela vitória. A democracia é a voz do povo e ela deve ser sempre respeitada", afirmou Lula, nas redes sociais.

 

Comércio

 

Na esfera comercial, as atenções do Brasil envolvem o possível tarifaço prometido por Trump. Ele já ameaçou, durante seu primeiro mandato, impor tarifas sobre aço e alumínio brasileiros. Um observador familiarizado com o assunto diz que o republicano "tende a ser protecionista, mas pragmático" e um indicador importante para verificar o potencial de atritos será a existência de superávit com os EUA. No caso do Brasil, a balança é deficitária - o País importa mais do que exporta aos americanos.

 

A ordem no governo brasileiro é dar declarações otimistas. Mas, se Trump adotar algumas medidas prometidas, a redução da taxa de juros nos EUA pode ficar prejudicada no fim de 2025. Diante desse cenário, a tendência é que a alta dos juros chegue ao Brasil justamente em 2026, quando Lula pretende concorrer à reeleição.

 

A leitura política de governistas é a de que Trump pode fortalecer o bolsonarismo. Inelegível até 2030, Bolsonaro está convencido de que conseguirá derrubar essa restrição e tenta se manter em evidência para controlar a direita. Partidários do ex-presidente esperam que Trump exerça pressão por ele, principalmente sobre o Supremo Tribunal Federal (STF). (COM FELIPE FRAZÃO E VERA ROSA)

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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A maioria dos brasileiros avalia que um candidato que tenha apoio ou se vincule de alguma forma ao presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, sairá prejudicado nas eleições presidenciais de 2026. Os dados são da pesquisa Ipespe divulgada nesta quinta-feira, 24, que afere os impactos do tarifaço anunciado pelo presidente americano na percepção dos brasileiros.

Segundo o levantamento, 53% acham que a influência ou apoio de Trump pode prejudicar um candidato à Presidência do Brasil, enquanto 32% pensam que ajudará um postulante ao cargo. Outros 14% não sabem ou não responderam.

Observando os dados quanto à posição ideológica, 88% dos que se consideram de esquerda acham que o candidato sairá prejudicado. Entre os entrevistados de centro, 69% também pensam assim. Já dos que de declaram de direita, 66% acham que o apoio de Trump ajudará o candidato.

A família e apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) têm defendido as tarifas impostas pelo americano, que justifica a medida criticando o tratamento dado ao ex-presidente e as decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) contra empresas americanas de tecnologia. Trump também pediu que a Justiça encerre a ação penal contra Bolsonaro, réu por golpe de Estado.

A pesquisa também perguntou se os entrevistados aprovam ou desaprovam as declarações dadas por lideranças brasileiras após o anúncio das tarifas. Quem saiu mais prejudicado foi o próprio Bolsonaro, com 60% de desaprovação.

Na sequência aparece seu filho, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), com 59%. Eduardo se mudou para o país americano em fevereiro, declaradamente em busca de sanções contra autoridades brasileiras, e tem um inquérito aberto no STF para investigar a atuação contra a soberania nacional.

Os presidentes da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), também tiveram a imagem prejudicada, recebendo 49% de menções desaprovando o comportamento de cada um.

Amplamente criticado, tanto pela oposição quanto por aliados, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), teve 46% de reprovação. Nos primeiros dias, Tarcísio apoiou a defesa de Trump a Bolsonaro e responsabilizou o governo Lula pela crise. Depois, se reuniu com chefe da embaixada dos Estados Unidos, Gabriel Escobar, em busca de soluções.

Já os governistas, que assumiram o discurso da soberania nacional e defenderam os interesses nacionais, foram os mais aprovados pela população. Lula recebeu 50% de aprovação, o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), 42%, e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, 38% das menções.

No geral, 50% dos entrevistados aprovam a reação do governo brasileiro diante do tarifaço, e 46% desaprovam. Apenas 5% não souberam ou não responderam à questão.

Taxação de big techs

Nos bastidores, pesou na decisão de Trump o avanço do Brasil em legislações que afetam as big techs, como o julgamento do artigo 19 do Marco Civil da Internet, a proposta de regulação da inteligência artificial, as novas diretrizes do Brics sobre soberania digital e as minutas de regulamentação de plataformas e mercados digitais que devem ser encaminhadas ao Congresso.

Em defesa do País após anúncio do tarifaço, Lula afirmou que o Brasil não cederá à pressão da Casa Branca para aliviar regulação e tributação das plataformas e que vai "cobrar imposto das empresas americanas digitais". Segundo o levantamento, 55% concordam com a posição do presidente de taxar o setor, ante 40% que discorda, e 5% que não sabem ou não responderam.

Sanções a ministros do STF

Em outro capítulo da guerra comercial e diplomática, o secretário de Estado do governo de Donald Trump, Marco Rubio, anunciou a revogação do visto do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e de seus aliados na Corte.

A maioria da população desaprova a medida tomada pelo governo americano contra os ministros: são 57% os que discordam, e 37% os que concordam. Outros 6% não souberam ou não responderam.

A pesquisa Ipespe ouviu 2.500 pessoas de 16 anos ou mais, entre os dias 19 e 22 de julho, tem margem de erro de dois pontos porcentuais e índice de confiança de 95,45%.

O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) afirmou nesta quinta-feira, 24, que o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), faz "defesa intransigente" do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).

"Quando o presidente Alcolumbre vai entender que ele não pode ficar fazendo uma defesa intransigente do ministro Alexandre de Moraes, seja por qual razão for?", questionou o filho "01" do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em entrevista ao Metrópoles.

O Estadão tentou contato com o senador Davi Alcolumbre, mas não havia obtido um retorno até a publicação deste texto.

Flávio Bolsonaro afirmou ainda que Davi Alcolumbre, ao presidir o Senado, "tem que ter a responsabilidade de cumprir o seu papel como chefe de instituição e ler o meu pedido de impeachment contra o ministro Alexandre de Moraes".

O senador protocolou nesta quarta-feira, 23, um pedido de impeachment contra o ministro do Supremo, acusando Moraes de crimes de responsabilidade e afirmando que ele agiu de forma parcial e censurou manifestações políticas do pai e de seu irmão, deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP).

"A manutenção da ordem constitucional e o respeito ao devido processo legal não são compatíveis com a perpetuação de abusos revestidos de legalidade aparente. O Senado Federal, neste momento, não apenas pode, como deve agir, em nome da democracia, da justiça e da preservação da imparcialidade do Judiciário brasileiro", disse o senador no requerimento.

Além de dizer que as medidas cautelares impostas pelo ministro contra o pai Jair Bolsonaro configuram censura, o senador fez um paralelo da atuação do irmão nos Estados Unidos com a de outras autoridades brasileiras e seus aliados, acusando a Corte de disparidade no tratamento.

"Afinal, por que as manifestações políticas de Eduardo Bolsonaro, ainda que incisivas, são consideradas uma ameaça ao Estado brasileiro, enquanto a ida de Dilma Rousseff à tribuna da ONU para denunciar um suposto golpe institucional ou as viagens internacionais de Cristiano Zanin promovendo a narrativa de que Lula era vítima de um sistema judicial corrompido não ensejaram sequer investigação?", questionou o parlamentar.

Uma empresa sediada na Flórida, nos Estados Unidos, pediu sanções contra Alexandre de Moraes e outros ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) a partir da "Lei Magnitsky".

A entidade Legal Help 4 You, que declara atuar em assessoria jurídica, ingressou como parte interessada (amicus curiae) no processo movido por Rumble e Trump Media contra Moraes na Justiça americana. As autoras da ação acusam o magistrado de "censura" e violação à soberania dos Estados Unidos.

A Legal Help 4 You foi fundada em maio de 2024 por Rogério Scotton, um brasileiro radicado nos Estados Unidos processado 27 vezes por fraude postal e duas vezes por falso testemunho.

Em 2024, Scotton foi condenado a nove meses de prisão por fraudes contra empresas de logística. Além do período de reclusão, o brasileiro foi sentenciado a pagar mais de US$ 2,5 milhões em indenização. Ele recorre da decisão em instâncias superiores e acusa a Justiça dos Estados Unidos de "obstruções claras ao seu direito de defesa". No Brasil, Scotton declarou ter domicílio em Lagoa Santa, na Região Metropolitana de Belo Horizonte.

A Legal Help 4 You afirma prestar assessoria jurídica, mas não demonstra em quais causas tem atuado. O Estadão questionou a entidade sobre casos em que é parte, mas a empresa não respondeu, alegando que não poderia fornecer a informação por questões de "ética profissional e responsabilidade legal".

A companhia é sediada em Boca Raton, uma cidade ao sudeste da Flórida, enquanto Alexandre de Moraes é processado em um tribunal de Tampa, na costa oposta do Estado. A empresa registrou seu endereço em um centro comercial.

Ao ingressar como amicus curiae na ação contra Moraes, a Legal Help 4 You pediu sanções contra o magistrado nos termos da Lei Magnitsky. A norma foi criada para punir violadores graves dos direitos humanos, como autoridades de ditaduras, integrantes de grupos terroristas e criminosos ligados a esquemas de assassinatos em série e lavagem de dinheiro.

A entidade pediu que outros ministros do STF além de Moraes sejam sancionados, mas não especificou quais. Como mostrou o Estadão, o uso da Lei Magnitsky para punir um ministro de Suprema Corte seria inédito.

O governo Trump revogou os vistos de Moraes e outros sete ministros da Corte na última semana. A medida vinha sendo especulada desde maio, quando o secretário de Estado do país, Marco Rubio, anunciou que haveria a revogação de vistos de autoridades "cúmplices na censura de americanos".

Moraes impôs medidas cautelares a Bolsonaro na sexta-feira. Segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), o ex-presidente tentou obstruir o curso do processo em que é réu por meio de "entraves econômicos" no relacionamento entre Brasil e Estados Unidos.