O que é GLO e por que Janja não quis que Lula a assinasse em 8 de janeiro

Política
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Com a crise instalada no ataque aos prédios dos Três Poderes, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) cogitou assinar um decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) para conter a situação, mas foi desaconselhado a baixar a norma pela primeira-dama Rosângela da Silva, a Janja. "É tudo o que eles querem", disse a primeira-dama, conforme relatou o presidente no documentário "8/1 - A Democracia Resiste", produzido pela GloboNews.

"Foi a Janja que invalidou: 'Não aceita a GLO, porque GLO é tudo que eles querem. É tomar conta do governo'. Se eu dou autoridade pra eles, eu tinha entregado o poder pra eles", disse Lula na produção, divulgada neste domingo, 7.

Diante do conselho de Janja, o presidente optou por outra via para estancar a crise em Brasília: a intervenção federal, prevista no Artigo 34 da Constituição. O nº 2 do Ministério da Justiça e Segurança Pública, o secretário-executivo Ricardo Cappelli, foi nomeado interventor da área de segurança pública no Distrito Federal e liderou o trabalho com a Polícia Militar do DF para contornar a crise. "Eu tomei a decisão, falei pro Flávio Dino: 'Vamos fazer o que tiver que fazer, não tem GLO'", afirmou o presidente.

O uso da Garantia da Lei e da Ordem foi conclamado por apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) que não aceitaram o resultado das eleições de 2022. Nas semanas que antecederam os ataques de 8 de Janeiro, o termo havia se tornado uma palavra de ordem nos acampamentos golpistas. Entenda, a seguir, o que é GLO, como o dispositivo poderia ter sido acionado em 8 de janeiro de 2023 e por qual razão Janja desaconselhou o presidente da alternativa.

O que é GLO?

A Garantia da Lei e da Ordem (GLO) é um dispositivo excepcional para o controle de uma crise na segurança pública. Enquanto uma GLO está em vigor, as autoridades do Exército passam a exercer o poder de polícia, o que confere permissão para revistar pessoas, dar voz de prisão e fazer patrulhamento. A norma deve ser acionada por iniciativa da Presidência da República e, no ato da convocação, devem ser especificadas a área e o período nos quais o dispositivo estará valendo. Trata-se de uma intervenção pontual e com prazo para acabar.

Segundo Carlos Ari Sundfeld, professor de Direito da Fundação Getulio Vargas (FGV), o dispositivo está previsto em lei para ser usado para suprir a falta de agentes das forças tradicionais de segurança. "Naquele dia, em Brasília, a Polícia Militar deveria ter evitado o que aconteceu. Surgiu, então, um problema de ineficiência da PM. E a GLO é o instrumento previsto pela Constituição para uma situação de crise em que a PM não dá conta ou a PM é a causa da crise", explicou o professor.

Quem já acionou a GLO?

Todos os presidentes desde 1992 acionaram a Garantia da Lei da Ordem para conter uma crise de segurança pública, inclusive Lula. Levantamento do Estadão revelou que, nos últimos 30 anos, o Brasil teve uma média de cinco GLOs por ano - foram 146 situações do gênero. O recordista é Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que assinou 46 decretos de GLO nos oito anos em que governou o País. Lula vem logo atrás, com 41 intervenções do gênero.

O levantamento do Estadão revela que o uso de GLOs assumiu diferentes finalidades ao longo das últimas décadas. As razões para o decreto de Garantia da Lei e da Ordem vão desde violência urbana, greve de policiais militares e até mesmo processos eleitorais.

Lula é o responsável pela última vez em que uma GLO foi acionada. Em novembro de 2023, o presidente assinou um decreto autorizando o emprego do Exército, da Marinha e da Aeronáutica em portos e aeroportos do Rio de Janeiro e de São Paulo. A medida está em vigor até maio de 2024. Ele assinou a GLO quatro dias depois de dizer que, enquanto ocupasse o Palácio do Planalto, "não haveria GLO".

Apesar do alto índice de GLOs baixadas pelo petista durante suas gestões, o PT tentou, recentemente, emplacar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para acabar com o dispositivo. Batizada pelos seus autores de "PEC antigolpe", a proposta não obteve consenso nem mesmo na base do governo Lula e acabou não sendo levada adiante.

A GLO poderia ter sido acionada em 8 de Janeiro?

Para Carlos Sundfeld, é "natural" que o acionamento da GLO tenha sido cogitado como reação aos atos golpistas, pois o dispositivo está previsto em lei para situações em que o controle de determinada situação tenha escapado às autoridades locais, como a Polícia Militar do Distrito Federal durante o 8 de Janeiro. "Era natural que naquela situação se cogitasse, como uma das hipóteses, o acionamento das Forças Armadas, porque, em tese, elas estão sob o comando do governo federal", afirmou o professor.

Outros fatores, no entanto, foram avaliados para que Lula preferisse a intervenção federal, prevista no Artigo 34 da Constituição, em vez da GLO. "O risco que o presidente da República avaliou era de, ao acionar as Forças Armadas, colocar os militares num papel de protagonismo, o que não seria conveniente por conta das características dessa crise política", disse o professor da FGV.

Por que Janja não quis a GLO?

Como mostra o documentário produzido pela GloboNews, Lula atribui a Janja o conselho de não acionar a GLO, o caminho "natural", como resposta ao 8 de Janeiro. Segundo Edinho Silva (PT), prefeito de Araraquara - cidade onde estava o casal no dia 8 de janeiro -, Janja disse: "GLO não, é entregar para os militares".

Para o professor Carlos Sundfeld, além de não querer conferir protagonismo aos militares, a primeira-dama, possivelmente, avaliou qual seria o recado que Lula daria aos manifestantes ao decretar a Garantia da Lei e da Ordem. Nos meses que antecederam os atos golpistas, GLO havia se tornado palavra de ordem nos acampamentos instalados nas bases do Exército em todo o País. A alegação era de que um decreto dessa natureza era necessário diante de uma suposta fraude - jamais comprovada - no sistema eleitoral.

"A esposa do presidente da República podia estar alertando-o: 'Não faça um gesto político que pareça uma vitória das pessoas que estão fazendo quebra-quebra na rua", disse Sundfeld.

GLO é a mesma coisa que intervenção militar?

Não. GLO, intervenção federal e intervenção militar são três conceitos diferentes e não resguardam relação entre si. A GLO, como explicado, é prevista pelo Artigo 142 da Constituição Federal. Além disso, a Garantia de Lei e da Ordem é regulamentada pela Lei Complementar nº 97/1999 e pelo Decreto nº 3.897/2001.

Carlos Ari Sundfeld ressalta que nenhuma dessas normas confere "poder moderador" às Forças Armadas. "Isso é completamente falso. Nenhuma Constituição no mundo, inclui-se a brasileira, confere às Forças Armadas a iniciativa de intervir na ordem política."

Por intervenção militar, entende-se uma ruptura no Estado Democrático de Direito liderada por um comando do Exército.

Intervenção federal, por outro lado, é um dispositivo previsto na Constituição Federal do Brasil por meio do Artigo 34. Foi a via escolhida pelo presidente Lula para lidar com a crise de 8 de Janeiro, com a nomeação do interventor Ricardo Cappelli.

Tal como a GLO, a intervenção é um instrumento acionado excepcionalmente para crises de segurança pública, mas resguarda diferenças cruciais em relação à Garantia da Lei da Ordem. Depende, por exemplo, de aprovação do Congresso Nacional; além disso, o comando das forças de segurança do local no qual se intervém ficam sob a gerência do interventor, e não das Forças Armadas.

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O primeiro-ministro da Austrália, Anthony Albanese, foi reeleito neste sábado, 3, e seu Partido Trabalhista deve conseguir o maior número de cadeiras na Câmara dos Representantes, ultrapassando o bloco conservador dos partidos Liberal e Nacional, segundo projeções dos principais veículos de comunicação do país.

A vitória marca mais uma reviravolta eleitoral no mundo impulsionada por um sentimento anti-Trump dos eleitores - similar ao que aconteceu no Canadá, onde os conservadores lideravam até a vitória de Donald Trump nos EUA e sua retórica de transformar o Canadá no "51º Estado americano".

A reviravolta foi impulsionada em grande parte pela raiva em relação à guerra comercial do presidente Donald Trump e seu impacto sobre a Austrália, um aliado militar e parceiro comercial próximo dos EUA.

As tarifas de Trump - primeiro 25% sobre o alumínio e o aço da Austrália e, depois, 10% sobre todos os outros produtos - levaram os eleitores a escolher Albanese equilibrado e a se afastar de seu oponente conservador, Peter Dutton, cujas políticas e retórica ecoaram o presidente americano, disse Sean Kelly, colunista político do Sydney Morning Herald.

"Trump dominou totalmente a trajetória desta eleição", disse Kelly, acrescentando que a incerteza global desencadeada por Trump tornou "a chatice de Albanese uma mercadoria bastante atraente".

O Fator Trump na Política Australiana

Albanese é o mais recente líder de esquerda a conseguir uma reeleição graças ao efeito rebote da eleição de Donald Trump. O Partido Liberal da Austrália também liderava as pesquisas antes da vitória de Trump e a imposição do tarifaço do presidente americano. Peter Dutton, líder do Partido Liberal, um ex-policial com reputação de ser linha-dura com o crime e a imigração, foi criticado durante toda a campanha por ser ideologicamente próximo ao presidente dos Estados Unidos.

Dutton, que chegou a elogiar Trump neste ano chamando-o se "grande pensador", reconheceu a derrota e disse ter telefonado para Albanese para parabenizá-lo. Admitindo a perda de sua própria cadeira como representante de Dickson no Parlamento, cargo que ele ocupou por duas décadas, Dutton afirmou que conversou também com a candidata trabalhista Ali France.

Dutton, que chegou a elogiar Trump neste ano chamando-o se "grande pensador", reconheceu a derrota e disse ter telefonado para Albanese para parabenizá-lo. Admitindo a perda de sua própria cadeira como representante de Dickson no Parlamento, cargo que ele ocupou por duas décadas, Dutton afirmou que conversou também com a candidata trabalhista Ali France.

"Não nos saímos bem o suficiente durante esta campanha. Isso é óbvio esta noite, e eu aceito total responsabilidade por isso", disse ele, prometendo uma reconstrução do bloco conservador. "Fomos definidos por nossos oponentes nesta eleição, o que não é a verdadeira história de quem somos."

No começo da campanha, influenciada pela forma como os candidatos poderiam negociar com Trump na questão das tarifas, os trabalhistas estavam atrás nas pesquisas, mas conseguiram virar o jogo, como apontam as estimativas. Com 68% dos votos contados, o site da Comissão Eleitoral Australiana projetou que o Partido Trabalhista ganharia 81 das 150 cadeiras da Câmara dos Representantes.

"Nosso governo escolherá o caminho australiano, porque temos orgulho de quem somos e de tudo o que construímos juntos neste país. Não precisamos implorar, pedir emprestado ou copiar de nenhum outro lugar. Não buscamos nossa inspiração no exterior. Nós a encontramos aqui mesmo em nossos valores e em nosso povo", disse Albanese, sob aplausos, na festa dos trabalhistas em Sydney.

Efeito rebote da eleição de Trump

"Em todo o mundo, a impopularidade de Trump representa uma oportunidade para os partidos políticos de centro-esquerda", disse Michael Fullilove, diretor executivo do Lowy Institute, um think tank de Sydney, ao The Washington Post.

A maior história da eleição australiana foi o colapso de Dutton, o líder de uma coalizão conservadora composta pelo Partido Liberal e pelo Partido Nacional rural.

O ex-policial havia travado uma guerra cultural semelhante à de Trump contra programas de diversidade e programas escolares "progressistas", chegando a prometer uma versão australiana do DOGE dos EUA.

Mas como as tarifas de Trump abalaram a fé dos australianos nos Estados Unidos e aumentaram os temores de uma recessão, apelidos como "DOGE-y Dutton" e "Temu Trump" começaram a incomodar, disseram os analistas.

"Um fator que todos nós podemos identificar é o fator Trump", disse o senador liberal James Paterson à Australian Broadcasting Corp. quando os resultados começaram a ser divulgados. "Foi devastador no Canadá para os conservadores, onde o líder conservador canadense Pierre Poilievre perdeu 20 pontos em poucos meses. E acho que isso tem sido um fator aqui".

No entanto, Dutton também foi prejudicado por uma série de erros, incluindo anúncios tardios de políticas, declarações incorretas embaraçosas e reviravoltas em questões importantes.

No entanto, o Canadá recebeu um tratamento mais duro do que a Austrália, e a resposta de Albanese foi mais contida. Sua resposta mais rígida foi chamar as tarifas de Trump de "um ato não-amigável".

Em parte, isso se deve ao fato de a Austrália estar economicamente menos ligada aos Estados Unidos do que o Canadá e, portanto, não sentir o mesmo impacto imediato das tarifas. Mas isso também reflete a dependência de longa data da Austrália do poderio militar dos EUA.

Austrália entre os EUA e a China

Tanto Albanese quanto Dutton, um ex-ministro da defesa, dobraram a aliança de segurança com os Estados Unidos, incluindo um acordo para a Austrália comprar submarinos nucleares para conter a crescente assertividade militar chinesa na região.

Mas Pequim também é o maior parceiro comercial de Canberra e a Austrália quer manter o fluxo de navios de seu minério de ferro para a China, mesmo quando a Austrália compra armas de Washington.

"O maior desafio para o próximo governo é gerenciar o triângulo estratégico entre Washington, Pequim e Canberra", disse Fullilove. "Os EUA são nosso grande aliado de segurança e a China é nosso parceiro econômico mais importante - e eles estão atualmente em conflito."

As eleições australianas raramente giram em torno de assuntos estrangeiros, observou ele, mas tanto Albanese quanto Dutton fizeram o possível para evitar questões internacionais na campanha.

"Somos uma nação de 27 milhões de pessoas ocupando um continente distante de nossas fontes históricas de segurança e prosperidade", disse ele. "A ordem internacional da qual dependemos está se desgastando. Precisamos responder adequadamente às mudanças no mundo."

Albanese agora terá que guiar a Austrália em meio a uma guerra comercial entre os EUA e a China, que pode ser prolongada, ao mesmo tempo em que segue sua agenda doméstica progressista.

enfrenta crises de custo de vida e de moradia, disse Kelly. No entanto, mesmo antes de sua primeira eleição em 2022, Albanese já se apresentava como um líder discreto - um distanciamento intencional da intensidade da liderança autraliana no período da covid e do caos de Trump.

"O que ele identificou há muito tempo (...) foi a ideia de que os eleitores estavam cansados de conflitos", disse Kelly. "E, como aconteceu, isso jogou a favor de seus pontos fortes. Ele não é um grande showman. Não é um grande orador. Não é um cara chamativo. Pode-se dizer que ele estava tirando proveito de suas possíveis fraquezas, mas é isso que um bom político faz."

O resultado foi uma reversão extraordinária em relação a seis meses atrás, quando Albanese estava atrás nas pesquisas após o maior tropeço de seu mandato: a derrota enfática de um referendo constitucional de outubro de 2023 para criar um órgão consultivo indígena, ou "voz", para o Parlamento.

A votação em Cingapura, realizada neste sábado, para a eleição geral é vista como o primeiro teste importante de apoio ao primeiro-ministro, Lawrence Wong, que assumiu o cargo no ano passado.

A tendência é de que o Partido de Ação Popular, de Wong, estenda seus 66 anos de domínio na cidade-Estado. No entanto, a eleição está sendo observada atentamente para ver se a oposição consegue obter mais avanços, conforme as pessoas expressam insatisfação com o rigoroso controle governamental e o alto custo de vida.

Wong, um economista treinado nos Estados Unidos, que também é ministro das Finanças, apelou por um mandato contundente para guiar Cingapura dependente do comércio em meio à turbulência econômica após os aumentos tarifários feitos pelo presidente dos EUA, Donald Trump. O governo reduziu a previsão comercial e alertou para uma possível recessão à frente.

Oficiais da administração Trump estão explorando maneiras de desafiar o status de isenção fiscal de organizações sem fins lucrativos, segundo pessoas familiarizadas com o assunto, em uma movimentação que alguns funcionários do Serviço Interno da Receita (IRS, em inglês) temem que possa danificar a abordagem apolítica da agência.

Em reuniões que duraram horas e continuaram durante um fim de semana recente, advogados do IRS exploraram se poderiam alterar as regras que governam como grupos sem fins lucrativos podem ser negados o status de isenção fiscal, disseram as pessoas.

As reuniões começaram a acontecer logo depois que a administração Trump nomeou um novo advogado interino de topo na agência, Andrew De Mello, que Trump havia nomeado para um posto diferente em seu primeiro mandato. De Mello discutiu privadamente as regras de organizações sem fins lucrativos com oficiais da agência, incluindo aqueles da divisão de isenção fiscal, segundo pessoas familiarizadas com o assunto.

Outro oficial sênior do IRS, Gary Shapley, disse separadamente em pelo menos uma reunião que está dando prioridade à investigação do status de isenção fiscal de um grupo selecionado de organizações sem fins lucrativos, segundo pessoas familiarizadas com suas declarações. Shapley fez os comentários como o vice-chefe da unidade de investigações criminais. Shapley, que também é conselheiro do Secretário do Tesouro, Scott Bessent, não nomeou quaisquer grupos específicos, disseram as pessoas.

Oficiais da administração Trump fora do IRS também tiveram conversas contínuas sobre como potencialmente mirar no status de isenção fiscal e dotações de organizações sem fins lucrativos por meses, disse um oficial da administração.

Um oficial da Casa Branca na sexta-feira, 2, disse que a administração atual não está envolvida em decisões sobre o status de isenção fiscal de qualquer instituição, incluindo a de Harvard. É crime para o presidente, o vice-presidente ou certos outros oficiais de topo solicitar uma auditoria ou investigação específica do IRS.

(Com Dow Jones Newswires)