Só três em cada 10 brasileiros esperam alta da tolerância política em 2023

Política
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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva comanda um País fraturado, sem expectativa de reconciliação no curto prazo. Somente três em cada dez brasileiros dizem acreditar que a tolerância entre os cidadãos aumentará em 2023, segundo levantamento do instituto de pesquisa Ipsos. A percepção negativa está atrelada ao cenário de polarização política, que não mostra sinais de arrefecimento.

Os atos golpistas em Brasília, no fim de semana passado, reforçam a sensação de intolerância. Apoiadores extremistas do ex-presidente Jair Bolsonaro promoveram uma série de atos de violência na Praça dos Três Poderes, com invasão e depredação do Palácio do Planalto, do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal (STF). Vândalos foram presos em massa, além de autoridades da segurança pública do Distrito Federal.

Lula até tentou recorrer ao discurso da "frente ampla" durante a campanha e a formação do Ministério. Porém, segundo o CEO do Ipsos, Marcos Calliari, o levantamento mostra que o resultado das urnas não foi suficiente para levar ao aumento expressivo na percepção da sociedade quanto à tolerância política. "O enraizamento da polarização é tão grande que ela segue presente mesmo após uma eleição que em tese poderia dirimir qualquer rivalidade", afirmou.

O levantamento do instituto - realizado no fim do ano passado em 36 países para captar os sentimentos para este ano e divulgado no início de 2023 - indica que a média global de percepção de tolerância é de 34%, considerada baixa. O índice é o mesmo no Brasil. Em toda a amostra, foram 24.471 pessoas entrevistadas. Já no Brasil, foram ouvidas mil pessoas, com margem de erro de 3,5%, para mais ou para menos.

Para 2023, 56% dos brasileiros entrevistados disseram esperar menos tolerância no País. De acordo com Calliari, o cenário de intolerância é um fenômeno mundial que não se restringe ao Brasil. "O momento é muito preocupante de maneira geral. Há divisão em especial na política, mas também de classes sociais, religiões, racial e de gênero", afirmou.

Conciliação

Nesse cenário, o cientista político e professor da Sciences Po Paris Miguel Lago disse que Lula deve se conciliar com os eleitores de direita que, independentemente de votar em Bolsonaro, acreditam na democracia. O saldo da invasão das sedes dos três Poderes no domingo, segundo ele, pode ter sido positivo nesse sentido ao afastar os moderados do radicalismo.

"O ato de domingo trouxe uma oportunidade de a classe política inteira abraçá-lo (Lula). Tem várias maneiras de atrair essa parcela da população para um discurso de união nacional. A capacidade de condenar essa atividade (a invasão) é um prenúncio de que é possível arregimentar forças em defesa da civilidade", disse o cientista político.

Não é possível extinguir subitamente a polarização, afirmou o cientista político, mas o atual presidente precisa trabalhar para que o País funcione e a sociedade consiga coabitar. A grande questão, segundo ele, é separar os atores que estão inseridos no jogo democrático daqueles que não estão. Ele defende que estes, diferentemente dos moderados, devem ser isolados, em vez de tolerados.

"A extrema direita não está no jogo democrático. Pode haver grande quantidade de pessoas de direita que votaram em Bolsonaro, mas o bolsonarismo é um movimento de extrema-direita, e eu não acho que seja possível uma reconciliação com esse movimento. Ele precisa ser derrotado", disse Lago.

Convergência

Nara Pavão, cientista política e professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), apresentou argumentos semelhantes ao de Lago. Segundo ela, Lula conseguiu consolidar no governo o apoio de partidos de esquerda e direita. Agora, o desafio será baixar a temperatura na sociedade, na qual a polarização se mostra ainda muito forte e com sinais de que veio para ficar.

De acordo com Nara, o petista precisa buscar a aprovação daqueles que votaram em Bolsonaro por questões circunstanciais, mas que não se identificam profundamente com o ex-presidente nem rejeitam fortemente o PT. Para isso, uma possibilidade será evitar o foco no embate político-partidário e focar em pautas unânimes, como o crescimento econômico e a diminuição de pobreza.

Para Nara, no entanto, tanto o governo quanto o bolsonarismo ganharam com os ataques golpistas. A opinião pública se mostrou contrária à violência e a favor da punição, mas o bolsonarismo mostrou força e capacidade de mobilização. "Foi uma demonstração de poder do bolsonarismo, também. Desastrosa no princípio, mas conseguiram se reposicionar atribuindo a violência a infiltrados. Isso cola com uma parcela da população e os fortalece", afirmou.

Paradoxo

O diretor do instituto de pesquisa Quaest e cientista político Felipe Nunes evocou o conceito de "paradoxo da tolerância", elaborado pelo filósofo Karl Popper no século passado, para refletir o Brasil atual. Segundo o autor inglês, pelo bem da democracia, os "intolerantes" devem deixar de ser tolerados quando passam a impor o seu desejo por meio da violência.

Nunes relacionou o conceito ao vandalismo bolsonarista na capital federal. Ele afirmou que houve uma mudança clara de postura do Estado e dos atores políticos após o episódio.

"Extremistas se reuniam em quartéis pedindo intervenção antidemocrática, e a sociedade tolerou. Mas, com a violência manifesta no domingo, esse limite foi ultrapassado. Se vivermos numa sociedade de tolerância ilimitada, colocamos em risco a própria tolerância em si", afirmou. De acordo com ele, a resposta das instituições aos grupos radicais deve ser forte.

Segundo os especialistas ouvidos pelo Estadão/Broadcast, a popularidade das redes sociais é um fator importante para se pensar a intolerância política. O comportamento dos perfis nas plataformas digitais tem impacto direto na maneira como os cidadãos dialogam, se aliam ou se opõem uns aos outros.

Em entrevista ao Estadão/Broadcast em novembro, a professora Letícia Cesarino, que comanda um grupo de estudos sobre redes sociais na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), afirmou que o modelo de organização da maioria das redes sociais se baseia na segmentação de públicos. Esse processo contribui para a intolerância e a polarização.

"Os algoritmos conectam igual com igual, e o que está se observando é uma tendência a intensificar um 'viés de confirmação', que é quando a pessoa recebe conteúdos que reforçam sua identidade. No caso da política, isso acaba virando um viés de bifurcação, ou seja, potencializa tanto a formação de identidade do indivíduo que divide o campo político em dois lados, em que um se vê como espelho invertido do outro", disse Letícia.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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O Ministério das Relações Exteriores alemão rebateu as críticas de autoridades americanas à decisão do país de classificar a Alternativa para a Alemanha (AfD) como extremista de direita. "Aprendemos com nossa história que o extremismo de direita precisa ser combatido", afirmou, em comunicado. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

A presidente do México, Claudia Sheinbaum, disse neste sábado, 3, que o presidente dos EUA, Donald Trump, propôs enviar tropas americanas ao México para ajudar seu governo a combater o tráfico de drogas, mas que ela rejeitou o plano.

As declarações de Sheinbaum foram feitas a apoiadores no leste do México, em resposta a uma reportagem do Wall Street Journal publicada na sexta, 2, descrevendo uma tensa ligação telefônica no mês passado na qual Trump teria pressionado ela a aceitar um papel maior para o exército dos EUA no combate aos cartéis de drogas no México.

"Ele disse, 'Como podemos ajudá-la a combater o tráfico de drogas? Eu proponho que o exército dos Estados Unidos venha e ajude você'. E você sabe o que eu disse a ele? 'Não, presidente Trump'", relatou a presidente do México. Ela acrescentou: "A soberania não está à venda. A soberania é amada e defendida".

"Podemos trabalhar juntos, mas vocês no território de vocês e nós no nosso", disse Sheinbaum. Com uma explosão de aplausos, ela acrescentou: "Nunca aceitaremos a presença do exército dos Estados Unidos em nosso território".

A Casa Branca não respondeu imediatamente a um pedido de comentário sobre as declarações de Sheinbaum. A postura firme de Sheinbaum neste sábado sinaliza que a pressão dos EUA por intervenção militar unilateral colocaria ela e Trump em atritos, após meses de cooperação em imigração e comércio. Fonte: Associated Press.

O presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski, disse estar pronto para um cessar-fogo com a Rússia a partir deste sábado, 3, caso o país rival aceite uma trégua de, pelo menos, 30 dias. "Esse é um prazo razoável para preparar os próximos passos. A Rússia precisa parar a guerra - cessar seus ataques e bombardeios", escreveu Zelenski em seu perfil da rede social X.

Na mesma publicação, o mandatário ucraniano disse estar se preparando para importantes reuniões e negociações de política externa. "A questão fundamental é se nossos parceiros conseguirão influenciar a Rússia a aderir a um cessar-fogo total - um silêncio duradouro que nos permitiria buscar uma saída para esta guerra. No momento, ninguém vê tal prontidão por parte da Rússia. Pelo contrário, sua retórica interna é cada vez mais mobilizadora", completou, pedindo sanções à energia e aos bancos russos para pressionar o país a parar os ataques.

Mais cedo neste sábado, 3, Zelenski negou a proposta de uma trégua de 72 horas proposta pela Rússia em virtude das comemorações do Dia da Vitória na Segunda Guerra Mundial, em 9 de maio. Os ucranianos também se negaram a garantir a segurança das autoridades que forem a território russo para as celebrações.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve desembarcar em Moscou no próximo dia 8 para participar do evento. A primeira-dama do Brasil, Janja Lula da Silva, já está em solo russo.