Celso Lafer: 'A política externa não representava abertura ao mundo'

Política
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Um dos signatários da carta dos chanceleres de 2020 que pedia a reconstrução da política externa brasileira, Celso Lafer é uma das maiores referências da diplomacia do País, bem como das preocupações com uma sociedade em que a philia aristotélica ocupe um lugar especial para a preservação do espaço público, a fim de garantir o bem-estar da comunidade e o diálogo político.

Lafer superou as diferenças que o afastavam de outros chanceleres da Nova República para denunciar a gestão de Ernesto Araújo - que pediu demissão anteontem - na pasta. Queria resgatar um mundo assinalado pela diversidade e pela criatividade do novo, como escreveu em A Reconstrução dos Direitos Humanos.

Chanceler dos governos Fernando Collor e Fernando Henrique Cardoso, ele contou ao Estadão o significado de sua oposição à gestão de Araújo no Itamaraty.

O artigo A Reconstrução da Política Externa Brasileira iniciou a formar o consenso em torno da necessidade de mudança no Itamaraty? Qual o impacto da gestão Araújo para nossa diplomacia, como ela se relacionava com os princípios históricos e legais dela?

Havia um consenso muito grande, apesar das diferenças reais entre os que participaram dessa discussão, de que a condução da política externa, tal como vinha sendo feita pelo governo Jair Bolsonaro e pelo Araújo, não correspondia às necessidades do País. Daí a ideia de escrevermos um artigo, que reunia os chanceleres do período da redemocratização, com uma visão de que essa política não correspondia ao acervo de realizações da política externa brasileira, seja no plano bilateral, seja no plano multilateral. Nem correspondia à tradição diplomática e ao capital simbólico que ela representa, ao seu soft power. Também não obedecia aos princípios que regem as relações internacionais do Brasil, corporificados na Constituição de 1988, que respondiam a uma avaliação da sociedade brasileira de que o rumo da política externa devia obedecer à cooperação entre os povos para o progresso da humanidade, à ideia da integração latino-americana, à defesa da paz e à solução pacífica de controvérsias. Enfim, ter a ideia de uma postura de abertura em relação ao mundo. E, independentemente das diferenças de tom e ênfase dos que redigiram o documento, concordamos que a política externa não representava no governo Bolsonaro uma abertura ao mundo.

Qual o significado dessa mudança na chancelaria para a relação do Brasil com as demais nações? Como isso pode ser entendido pelos observadores estrangeiros e qual o papel de Ernesto Araújo nessa história?

Quem conduz a política externa, de direito e de fato, é o presidente, com a colaboração do seu chanceler. E, naturalmente, o Ernesto Araújo conduziu a política externa alinhado com os rumos que o presidente Bolsonaro procurou imprimir ou, pelo menos, aos de grupos expressivos que o apoiam, aos quais ele dá atenção, o assim chamado grupo ideológico, para o qual a política externa do Ernesto, chancelada pelo presidente, respondia. O que eu vejo no momento atual do Brasil? Vejo uma insatisfação com esses rumos, com os quais o presidente tem dirigido o País. Essa insatisfação aparece em vários campos. Do ponto de vista da Saúde, nós sabemos qual é o grau de insatisfação que levou à saída de Eduardo Pazuello do ministério e da movimentação grande que essa saída tem como lastro, que vem da posição do Congresso e dos governadores, dos prefeitos e de uma insatisfação da sociedade com a continuidade de uma pandemia que não parece encontrar no governo federal o encaminhamento apropriado. A manifestação recente da carta escrita e subscrita por um grupo muito expressivo de empresários e economistas explica esse tipo de situação.

Qual será, então, o efeito da nomeação de Carlos Alberto França como novo chanceler?

Não o conheci. Sei que é um diplomata com experiência na América Latina e com interesse pelo tema da cooperação energética com um parceiro importante. Trabalhou no cerimonial e tem as qualificações profissionais do Itamaraty. Nunca dirigiu uma embaixada, o que é um experiência importante para um diplomata de carreira. O que se pode dizer é que não adianta trocar seis por meia dúzia. Não adianta substituir o Ernesto Araújo por alguém que seja mais comedido ou mais razoável, mas que não simbolize uma mudança significativa. Por isso, essa escolha é tão decisiva. O novo ministro deve ser uma pessoa que, simbolicamente, assinale essa mudança. Sem isso, não se recuperará a credibilidade internacional do Brasil. Pode ajudar a diminuir o desgaste, mas não vai mudar a percepção generalizada que existe hoje.

Uma das coisas que têm notabilizado o governo é a diplomacia paralela levada a cabo por Eduardo Bolsonaro nas suas relações com regimes como os da Polônia e da Hungria e forças da extrema-direita ao redor do mundo. De que forma isso provoca confusão e ruídos para a execução de uma política externa do País?

Olha, provoca na medida em que o Trump não foi reeleito. A única base maior que tinha o governo Bolsonaro e essa democracia paralela era a benevolência do Trump em relação a essas movimentações. Ela desaparece com o fim do que ela representou e nos deixa em uma posição muito desconfortável, pois, afinal de contas, sem demérito para a Hungria, para Polônia e para alguns países fundamentalistas do arco árabe, isso não ajuda a nossa respeitabilidade de maneira nenhuma. Nós estamos jogando fora recursos de presença internacional acumulados em troco de nada, em troca de uma desconectada visão ideológica do mundo.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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O governo Donald Trump informou que a Universidade de Harvard não poderá receber novos subsídios federais para a pesquisa até cumprir com as exigências, que colocaram a universidade mais rica e prestigiada o país em rota de colisão com a Casa Branca.

O bloqueio foi comunicado em carta enviada pelo Departamento de Educação ao reitor da universidade e confirmado em entrevista coletiva nesta segunda-feira, 5. O representante do departamento disse à imprensa que Harvard não receberá novos subsídios federais até que "demonstre uma gestão responsável da universidade" e atenda às exigências do governo.

A Casa Branca já havia congelado US$ 2,2 bilhões em subsídios federais destinados à universidade. Em outra frente, Trump pressiona para que Harvard perca o seu status de isenção fiscal enquanto tenta forçar a instituição de ensino a atender suas demandas.

A carta foi a primeira resposta significativa do governo desde que Harvard entrou com ação judicial na tentativa de impedir o corte bilionário de verbas. "Esta carta é para informá-lo de que Harvard não deve mais buscar subsídios do governo federal, pois nenhum será fornecido", escreveu a secretária da Educação Linda McMahon ao reitor Alan Garber.

O documento estipula que Harvard deve abordar preocupações relacionadas ao antissemitismo no campus; revisar políticas raciais; e responder a queixas de que teria abandonado a busca pela "excelência acadêmica" ao empregar relativamente poucos professores conservadores, segundo a visão do governo.

Representantes de Harvard não responderam imediatamente ao pedido de comentário.

A ameaça sugere que o governo pode estar alterando ou reforçando suas táticas contra as universidades. Inicialmente, a Casa Branca havia retirado subsídios existentes - medida drástica, mas que deixa margem para contestações na Justiça, como no caso de Harvard.

Representantes do setor em todo país tem expressado de forma reservada preocupações com uma campanha mais ordenada de pressão sobre as universidades, que seria mais difícil de reverter nos tribunais.

O embate com Harvard começou quando o governo Donald Trump enviou, no mês passado, um série de exigências à universidade. A lista incluía a obrigatoriedade de relatar ao governo federal quaisquer estudantes internacionais acusados de má conduta e a nomeação de um supervisor externo para garantir que os departamentos acadêmicos fossem "diversos em termos de pontos de vista".

A universidade se negou a cumprir as demandas da Casa Branca e denunciou uma tentativa de interferir na liberdade acadêmica. Na ação judicial, Harvard acusou o governo Donald Trump de tentar exercer um "controle inédito e indevido".

No ano fiscal de 2024, os recursos federais para pesquisa representaram cerca de 11% do orçamento de Harvard - aproximadamente US$ 687 milhões. Embora o fundo patrimonial da universidade ultrapasse os US$ 53 bilhões, grande parte desse valor é restrito, o que limita como a instituição pode utilizá-lo.

O congelamento duradouro dos novos subsídios poderia causar um caos financeiro para Harvard, que já está elaborando planos de contingência e buscando captar recursos no mercado de títulos. (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)

A primeira-ministra da província canadense de Alberta, Danielle Smith, disse que realizará um referendo no próximo ano que poderá incluir uma votação sobre a separação do Canadá.

Smith afirmou que não apoia a separação no site do governo da província e em sua página no Facebook, mas acrescentou que, caso os cidadãos de Alberta reúnam as assinaturas necessárias, uma pergunta sobre a separação poderá fazer parte da votação de 2026. "Nosso governo respeitará o processo democrático", enfatizou ela.

Seus comentários são a mais recente investida da província produtora de petróleo e gás depois que os liberais federais conquistaram um quarto mandato na eleição de 28 de abril. Smith, os líderes empresariais e os cidadãos de Alberta estão profundamente frustrados com a política ambiental da última década, que, segundo eles, prejudicou as perspectivas econômicas da província. As medidas incluem a proibição de navios-tanque que transportam petróleo bruto para o noroeste da Colúmbia Britânica, um limite para as emissões de carbono do setor de energia e um processo de avaliação ambiental mais rigoroso.

Ela disse que teve uma conversa telefônica construtiva nos últimos dias com o primeiro-ministro canadense, Mark Carney, mas "até que eu veja provas tangíveis de mudanças reais, Alberta tomará medidas para se proteger melhor de Ottawa".

Uma porta-voz de Carney não respondeu imediatamente a um pedido de comentário.

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, afirmou neste domingo, 4, que instruiu seu governo a reabrir e expandir a notória prisão de Alcatraz, que foi fechada em 1963 e se tornou um ponto turístico na Califórnia.

"Por muito tempo, os Estados Unidos foram atormentados por criminosos cruéis, violentos e reincidentes, a escória da sociedade, que nunca contribuirão com nada além de miséria e sofrimento. Quando éramos uma nação mais séria, no passado, não hesitávamos em prender os criminosos mais perigosos e mantê-los longe de qualquer pessoa que pudessem prejudicar. É assim que deve ser", disse Trump, em uma publicação na plataforma Truth Social.

"É por isso que, hoje, estou instruindo o Departamento de Prisões, juntamente com o Departamento de Justiça, o FBI e a Segurança Interna, a reabrir uma prisão de Alcatraz substancialmente ampliada e reconstruída, para abrigar os criminosos mais cruéis e violentos dos Estados Unidos", escreveu o presidente americano, acrescentando: "A reabertura de Alcatraz servirá como um símbolo de Lei, Ordem e justiça."

A ordem foi emitida em um momento em que Trump vem enfrentando conflitos com os tribunais ao tentar enviar membros de gangues acusados ??para uma prisão notória em El Salvador, sem o devido processo legal. Trump também já sinalizou que poderia enviar cidadãos americanos para El Salvador.

Trump também ordenou a abertura de um centro de detenção na Baía de Guantánamo, em Cuba, para abrigar até 30 mil detentos que ele rotulou como os "piores criminosos estrangeiros".

Prisão

Alcatraz, hoje uma atração turística, fechou em 1963 devido aos altos custos operacionais após apenas 29 anos de operação, de acordo com o Departamento de Prisões dos EUA, porque tudo, de combustível à comida, tinha que ser trazido de barco.

Localizada a dois quilômetros da costa de São Francisco e com apenas 336 prisioneiros, a prisão abrigou vários criminosos notórios, incluindo o chefe da máfia da época da Lei Seca, Al Capone, e foi palco de muitas tentativas de fuga incríveis dos presos.

36 homens tentaram 14 fugas diferentes da prisão, segundo o FBI. Quase todos foram capturados ou não sobreviveram à tentativa.

O local ficou conhecido pelo filme "Alcatraz: Fuga Impossível", longa de 1979 que é protagonizado por Clint Eastwood. O filme conta a história de três prisioneiros que conseguiram fugir de Alcatraz.

Um porta-voz do Departamento de Prisões dos EUA disse em um comunicado que a agência "cumprirá todas as ordens presidenciais".

Atualmente, o Departamento de Prisões tem 16 penitenciárias que desempenham as mesmas funções de alta segurança de Alcatraz, incluindo sua unidade de segurança máxima em Florence, no Colorado, e a penitenciária dos EUA em Terre Haute, em Indiana. (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)