Veja a íntegra do voto do ministro Cristiano Zanin para tornar réus Bolsonaro e mais sete

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O ministro Cristiano Zanin, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou a favor do recebimento da denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros sete aliados. Ele acompanhou integralmente o relator Alexandre de Moraes e considerou que há indícios suficientes para justificar a abertura de uma ação penal. A decisão da Primeira Turma foi unânime pela continuidade do caso.

Zanin destacou que a denúncia não se apoia exclusivamente na delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, mas em um conjunto de provas, incluindo documentos, relatórios, vídeos e mensagens. O ministro também afirmou que caberá à instrução criminal verificar a veracidade do material. "O que se tem aqui são diversos documentos, vídeos e dispositivos que dão amparo àquilo que foi apresentado pela acusação", afirmou.

Durante o voto de Zanin, o ministro Alexandre de Moraes fez uma intervenção para rebater críticas de que vídeos e documentos exibidos durante o julgamento não constariam nos autos. O relator exibiu vídeos da invasão às sedes dos Três Poderes, ocorrida em 8 de janeiro de 2023, para contextualizar a denúncia e reforçar a ligação entre os acusados e os atos violentos.

Veja a íntegra do voto do ministro Cristiano Zanin

Eu gostaria primeiro de registrar que hoje o ministro Alexandre de Moraes trouxe aqui, exibiu documentos e vídeos que mostram fatos extremamente graves e que, em tese, podem configurar os crimes de organização criminosa, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado e, ainda, dano qualificado e dano a bens protegidos por lei. Então, em tese, estamos aqui diante de fatos devidamente demonstrados e aptos a configurar, em tese, os crimes que foram narrados pela Procuradoria-Geral da República na denúncia apresentada. No meu voto, eu trago também.

Alexandre de Moraes: Permite?

Cristiano Zanin: Pois não.

Alexandre de Moraes: Eu sei por que Vossa Excelência disse isso. Já tem gente dizendo que isso não está nos autos. Da mesma forma que eu poderia, no meu voto, descrever isso por escrito, poderia colocar áudio ou poderia colocar vídeo, porque tanto o Código de Processo Penal quanto o Código de Processo Civil permitem fatos notórios e públicos que o juiz utilize. Todos esses fatos são públicos e notórios. Então, presidente, é de uma falta de seriedade, às vezes, essa milícia digital que já começou de novo. Ontem começou no julgamento e hoje, de novo. Então, até agradeço a Vossa Excelência ter dito, para já permitir que eu diga isso. Eu sei que pessoas sérias e profissionais sérios vão ignorar isso porque já leram o Código.

Cristiano Zanin: Obrigado, ministro Alexandre. Então, de fato, quer dizer, todos esses documentos e esse material ampararam a denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República, assim como diversos outros documentos que eu estou também aqui enumerando no meu voto. Não vou fazer a leitura, porque o ministro Alexandre também fez referência, ao longo do seu voto, a inúmeros outros documentos, depoimentos, mídias, celulares, relatórios de análise, informação da polícia judiciária, relatório de investigação policial. Então, há, sim, uma série de elementos aqui a amparar a denúncia que estamos aqui a analisar.

Como eu disse ontem, longe de ser uma denúncia amparada exclusivamente em uma delação premiada. O que se tem aqui são diversos documentos, vídeos e dispositivos - enfim, diversos materiais que dão amparo àquilo que foi apresentado pela acusação.

Também o ministro Alexandre de Moraes fez uma descrição detalhada da prova indiciária sobre - em relação, melhor dizendo - os denunciados. Se essa prova indiciária vai se confirmar ou não, é o que terá que ser feito e observado ao longo da instrução criminal.

Eu acho importante também registrar, eminentes ministros, que o Código Penal prevê o instituto do concurso de pessoas. Então, o artigo 29 diz: "Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a ele cominadas".

Então, o que que significa isso? Que não necessariamente o acusado tem que ter estado no dia 8 de janeiro. Mas, se ele concorreu, de alguma forma, para que esse evento tivesse ocorrido, ele responde nos termos da lei. É o que está expresso no Código Penal.

Então, ao meu ver, não adianta dizer que a pessoa não estava no dia 8 de janeiro, se ela participou de uma série de atos que culminaram nesse evento que, em tese, é compatível com os delitos descritos pela Procuradoria-Geral da República na denúncia.

Flávio Dino: Porque, se não fosse assim, não existiria mandante de homicídio, né?

Cristiano Zanin: Exatamente. Exatamente.

Ministro Flávio Dino: Ele apenas deu o ato material, né?

Cristiano Zanin: Exatamente.

Então, existem inúmeros documentos que mostram, em tese, a participação dos denunciados em atos que podem ter culminado no dia 8 de janeiro. Se esses documentos, se esses depoimentos são verdadeiros ou não, é o que se vai discutir ao longo da instrução.

Mas, neste momento, eu também considero que há materialidade e indício de autoria a ensejar o recebimento integral da denúncia, tal como exposto pelo voto do eminente relator. E, por isso, eu estou acompanhando, na íntegra, Sua Excelência. Farei a juntada de voto, que é também integralmente convergente com o voto do eminente relator.

Assim sendo, proclamo o resultado: a Turma, por unanimidade, recebeu a denúncia oferecida pela Procuradoria-Geral da República em face de Alexandre Rodrigues Ramagem, Almir Garnier Santos, Anderson Gustavo Torres, Augusto Heleno Ribeiro Pereira, Jair Messias Bolsonaro, Mauro César Barbosa Cid, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira e Walter Souza Braga Netto, nos termos do voto do relator.

Antes de encerrar, gostaria de agradecer a todos os servidores e colaboradores envolvidos na organização destas últimas sessões. Deixo de nominar individualmente, mas esse trabalho permitiu que tivéssemos aqui sessões tranquilas, para que pudéssemos efetivamente apreciar este caso e proferir os nossos votos, ouvir as sustentações orais e todas as considerações que foram trazidas. Então, com essas considerações, declaro encerrada a sessão. Desejo boa tarde a todos.

*Este conteúdo foi transcrito com o auxílio de ferramentas de Inteligência Artificial e revisado pela equipe editorial do Estadão. Saiba mais em nossa Política de IA.

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Soldados da Tailândia e do Camboja entraram em confronto em diversos pontos da fronteira disputada entre os dois países nesta quinta-feira, 24. Segundo informações de autoridades tailandesas, 11 civis e um soldado morreram durante o conflito.

Ambas as nações se acusaram de atacar primeiro. O Exército tailandês disse que o Camboja disparou foguetes contra áreas civis em quatro províncias tailandesas, levando a Tailândia a atacar com caças F-16 e drones contra alvos no Camboja e ordenar o deslocamento de civis das áreas de fronteira.

As autoridades do Camboja afirmaram que soldados tailandeses abriram fogo primeiro contra tropas do país do sudeste asiático no templo de Prasat Ta Muen Thom, local reivindicado por ambas as nações. As forças cambojanas revidaram cerca de 15 minutos depois.

Tensões

As tensões começaram no final de maio após a morte de um soldado cambojano em um confronto na fronteira entre tropas de ambos os lados. A disputa escalou na quarta-feira, 23, quando um soldado tailandês perdeu a perna em uma explosão de mina terrestre na fronteira.

O incidente fez com que a Tailândia expulsasse o embaixador do Camboja no país e retirasse o seu embaixador do país vizinho.

As autoridades tailandesas alegaram que as minas foram recentemente colocadas em locais que ambas as partes haviam concordado que deveriam ser seguros. Eles disseram que as minas eram de fabricação russa e não do tipo empregado pelo Exército da Tailândia.

O Camboja rejeitou a versão tailandesa como "acusações infundadas", apontando que muitas minas não detonadas e outras munições são um legado de guerras e distúrbios do século 20.

Conflito

Os vizinhos do Sudeste Asiático têm disputas de fronteira de longa data que periodicamente escalam ao longo de sua fronteira de 800 quilômetros e geralmente resultam em confrontos breves que envolvem trocas de tiros.

Em 2011, uma semana de confronto entre os dois países levou à morte de 15 pessoas, incluindo civis, e fez com que milhares de pessoas tivessem que ser deslocadas.

Segundo o porta-voz do ministério da Defesa da Tailândia, Surasant Kongsiri, os Exércitos dos dois países estavam em confronto em seis áreas ao longo da fronteira.

Crise política

O confronto com o Camboja mergulhou a Tailândia em uma crise política. No começo de julho, o Tribunal Constitucional da Tailândia suspendeu a primeira-ministra Paetongtarn Shinawatra em meio uma investigação ética de que ela teria sido excessivamente deferente a um oficial cambojano durante discussões sobre o conflito na fronteira.

A conversa telefônica foi vazada ao público e levou a insatisfação dos tailandeses com a maneira que a política estava lidando com a situação.

Depois dos incidentes desta quinta-feira, Paetongtarn Shinawatra, que permanece como líder do partido governante do país, condenou o que chamou de agressão cambojana. Ela disse nas redes sociais que forças do Camboja "iniciaram o uso de armas e atiraram em território tailandês - afetando tanto oficiais quanto civis inocentes."

Já o primeiro-ministro do Camboja, Hun Manet, afirmou em um comunicado que seu país "não teve escolha a não ser responder com força armada contra essa invasão".

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China

O confronto entre a Tailândia e o Camboja apresenta uma possível abertura diplomática para a China, que tem aumentado sua influência econômica e política em ambos os países em um momento em que governos no Sudeste Asiático estão se tornando cada vez mais cautelosos em relação aos Estados Unidos.

Pequim é o maior parceiro comercial de ambos os países e investiu pesadamente em infraestrutura em cada um. Na Tailândia, a China está ajudando o governo a construir uma ferrovia para conectar Bangcoc e o sudoeste da China. No Camboja, Pequim está construindo um enorme aeroporto e financiou a construção de prédios governamentais e a primeira via expressa do país.

Um porta-voz do ministério das Relações Exteriores da China, Guo Jiakun, disse nesta quinta-feira que Pequim estava "profundamente preocupada" com os conflitos e vinha trabalhando para facilitar as conversas entre os dois lados. (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)

Líderes extremistas e colonos judeus se reuniram no Parlamento de Israel, na terça-feira, para discutir a expulsão dos palestinos, a anexação de Gaza e a transformação do território em um "paraíso de luxo" e alta tecnologia exclusivamente para os israelenses. O encontro foi relatado nesta quinta-feira, 24, pelo jornal britânico The Guardian, que teve acesso ao projeto.

A ideia em discussão prevê uma "expulsão voluntária" de palestinos da Faixa de Gaza para a construção de 850 mil unidades habitacionais e um moderno sistema de metrô que atravessa o território. A inspiração é ideia do presidente dos EUA, Donald Trump, que em fevereiro sugeriu transformar Gaza na "Riviera do Oriente Médio". "O direito do povo de Israel de se estabelecer, desenvolver e preservar esta terra não é apenas histórico - é uma obrigação nacional e de segurança", diz o texto do projeto.

O plano é rejeitado pelos palestinos, que reivindicam o Estado da Palestina. O maior obstáculo de Israel é o que fazer com 2 milhões de moradores no território. Daniella Weiss, líder dos colonos, afirmou ao Guardian o que considera solução. "Os habitantes de Gaza não ficarão lá. Eles irão para outros países", disse ela ao jornal. Os palestinos, ela sugeriu, seriam realocados para o Egito e "países africanos", sem especificar quais.

Weiss garante ter uma lista de 1.000 famílias israelenses que já se inscreveram para viver em Gaza. "Meu plano é transformar o território em um paraíso, torná-la uma Cingapura", afirmou. Entre os participantes da reunião de terça-feira estava o ministro das Finanças, Bezalel Smotrich, peça-chave da coalizão do premiê, Binyamin Netanyahu.

O primeiro-ministro nega a intenção de anexar Gaza, mas seu ministro da Defesa, Israel Katz, sugeriu a construção de uma "cidade humanitária" no sul do território, onde seriam confinados mais de 600 mil palestinos, que seriam autorizadas a sair apenas para outros países.

Especialistas consideraram o plano um exemplo de limpeza étnica e crime contra a humanidade. O próprio Exército israelense rejeitou a ideia, afirmando que seria um pesadelo para a segurança de Israel. Ativistas dos direitos humanos dizem que a expulsão dos moradores de Gaza poderia ser considerada como deslocamento forçado mesmo que os palestinos saíssem por conta própria.

"Quando uma força de ocupação retém alimentos, e esse ambiente coercitivo não deixa outra escolha à população a não ser se deslocar, isso pode constituir um crime de guerra", disse ao Guardian Janina Dill, pesquisadora da Universidade de Oxford.

A pressão sobre Israel por crimes humanitários cometidos na Faixa de Gaza chamou a atenção de líderes globais nos últimos dias.

Em uma declaração nesta quinta-feira, 24, o primeiro-ministro do Reino Unido, Keir Starmer, afirmou que o sofrimento e a fome que estão ocorrendo no enclave são "indescritíveis e indefensáveis" e que, embora a situação já seja grave há algum tempo, ela atingiu novos patamares e continua a piorar. "Estamos testemunhando uma catástrofe humanitária".

Starmer ainda pontuou que fará uma chamada de emergência com a França, Alemanha e Itália para discutir a situação.

Paralelamente, o presidente francês, Emmanuel Macron, anunciou hoje através das redes sociais que a França reconhecerá o Estado da Palestina.

Mais de 100 organizações humanitárias e de direitos humanos alertaram ontem que o bloqueio de Israel e sua ofensiva militar contínua estão empurrando a população da Faixa de Gaza para a fome. Em carta aberta, 115 entidades, entre elas Médicos Sem Fronteiras, Mercy Corps e Save the Children, denunciaram que estão vendo "seus próprios colegas e os palestinos que atendem se definharem".

Nas últimas três semanas, pelo menos 48 pessoas morreram de causas relacionadas à desnutrição, incluindo 28 adultos e 20 crianças, informou o Ministério da Saúde de Gaza hoje, segundo a The Associated Press.