Antes de cúpula, Putin faz exigências para cessar-fogo, rejeitadas por Kiev

Internacional
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O presidente da Rússia, Vladimir Putin, declarou nesta sexta, 14, que negociará um cessar-fogo com a Ucrânia se Kiev retirar suas tropas das quatro províncias que Moscou reivindica e renunciar a uma adesão à Otan. Em uma reação imediata, a Ucrânia afirmou que Putin deu a ela um "ultimato à moda Hitler", dizendo que a proposta era equivalente a uma rendição. As declarações foram dadas na véspera do primeiro dia da Cúpula de Paz realizada na Suíça entre este sábado, 15, e domingo, 16, a pedido de Kiev, com a participação de diversos líderes mundiais, com exceção da Rússia.

O anúncio de Putin estipula que a Ucrânia entregue efetivamente enormes extensões de terra que Moscou controla parcialmente: as regiões de Donetsk, Luhansk, Kherson e Zaporizhzhia. A Rússia já anexou a região da Crimeia, em 2014. Foi o conjunto mais concreto de condições territoriais de Putin para encerrar a guerra até agora.

Kiev, por sua vez, disse que a Rússia deve retirar suas tropas de todo o território ucraniano internacionalmente reconhecido. "O objetivo (da declaração de Putin) é enganar a comunidade internacional, minar os esforços diplomáticos destinados a alcançar uma paz justa e dividir a unidade do mundo em relação aos princípios da Carta das Nações Unidas", afirmou o Ministério dos Negócios Estrangeiros ucraniano.

Ausências

A cúpula na Suíça reunirá representantes de mais de 90 países e tentará apresentar pontos de convergência entre nações do Ocidente e do Sul Global, apesar de ausências de peso como a própria Rússia e a China.

Não convidado para o evento, Moscou disse se tratar de uma "perda de tempo". A China, por sua vez, não comparecerá por considerar que Rússia e Ucrânia precisam estar juntas em negociações de paz.

Outros países importantes como Arábia Saudita e Paquistão também não enviaram delegações e Brasil e Índia mandariam representantes de menor peso diplomático.

A Suíça afirmou que a conferência é um primeiro passo para tratar de possíveis soluções para a paz e a Rússia deverá participar de uma segunda cúpula, ainda sem data.

A conferência focará três pontos que compõem uma fórmula de paz proposta pelo presidente ucraniano, Volodmir Zelenski: segurança nuclear, segurança alimentar e libertação de prisioneiros de guerra e crianças sequestradas.

"As questões são importantes para os participantes. Todos querem a livre circulação porque se abastecem dos grãos que vêm da região. A segurança nuclear também é uma preocupação mundial e a libertação de crianças é uma questão humanitária", avalia Vitelio Brustolin, professor da Universidade Federal Fluminense (UFF) e pesquisador da Universidade de Harvard.

Segundo um comunicado do governo suíço, são problemas civis e relevantes para países geograficamente distantes da Ucrânia, mas também afetados pela guerra, "particularmente, o Sul Global". A Ucrânia é uma grande produtora de grãos.

"Kiev vai tentar mostrar que os países de Ásia, África e América do Sul ficarão menos seguros se estes tópicos não forem resolvidos", avalia Simon Schlegel, analista para Ucrânia do centro de estudos International Crisis Group. Kiev quer ressaltar que essas são questões globais, não apenas ucranianas.

Reveses

Segurança alimentar e libertação de crianças deportadas para a Rússia estão entre os raros tópicos que Moscou e Kiev já conseguiram chegar a algum entendimento desde que o conflito começou, em fevereiro de 2022. As negociações, porém, sofreram reveses. "As propostas (novamente em discussão) não envolvem territórios e por isso é possível acreditar que seria mais fácil para a Rússia negociar", disse Brustolin.

O chanceler da Suíça, Ignazio Cassis, afirmou em entrevista coletiva que o país sabe que não é possível discutir o processo de paz sem a presença da Rússia. "A questão não é se a Rússia participará das negociações, mas quando", disse.

O governo suíço enviou convites para 160 líderes. Até ontem, 90 países tinham confirmado. O presidente dos EUA, Joe Biden, que estava na Itália para a cúpula do G-7, optou por retornar ao seu país para participar de um comício de campanha e será representado pela vice-presidente americana, Kamala Harris. Todos os outros líderes do G-7 confirmaram presença.

Documento final

Para o analista do International Crisis Group, é importante que Kiev consiga angariar um grande número de países. "É uma questão simbólica, o peso da cúpula será medido pelo número de países que participarão, pelo peso desses países e também pelo nível de autoridades importantes que estarão lá."

Mesmo assim, para o professor de relações internacionais da ESPM-SP, Gunther Rudzit, será difícil fazer com que os países do Sul Global apoiem um documento final no evento. "Muitas das nações que devem ir ao evento dependem financeiramente da China e Pequim não quer deixar a Rússia isolada", disse. (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)

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O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes manifestou ceticismo quanto ao avanço da proposta que visa revisar as penas dos envolvidos nos atos de 8 de Janeiro, além de defender que a responsabilidade pelo julgamento do caso permaneça com o Judiciário. A declaração foi feita na segunda-feira, 5, durante um evento promovido pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), realizado na Espanha.

"Acho fundamental que esse crime fique entregue aos tribunais. A eventual condenação ou absolvição dos responsáveis por esse episódio todo. Demos passos significativos. Até pouco tempo, falávamos que só os executores tinham sido atingidos. Agora, percebemos que também a cúpula desse movimento foi atingida", afirmou o decano do STF.

Gilmar Mendes declarou que a Corte se "orientou pelo dever de ação que decorre da Constituição" ao julgar os envolvidos nos atos do 8 de Janeiro e afirmou que o Supremo agiu em defesa da democracia.

"Nós poderíamos estar aqui, muitos de nós, contando a história de um golpe. Mas estamos aqui, ao contrário, com uma história constitucional de resistir a uma tendência autoritária, totalitária", disse Gilmar.

Também presente no seminário, o diretor-geral da Polícia Federal (PF), Andrei Rodrigues, disse que as sanções não devem ser desfeitas por "capricho político". O chefe da PF afirmou que as investigações conduzidas pela corporação identificaram não apenas os autores diretos das ações, mas também planos envolvendo homicídios e ataques à ordem democrática.

"São situações muito graves e que não podem simplesmente ser apagadas por capricho político. A minha posição, e é pública, é contrária ao processo de anistia, e as pessoas têm que ser responsabilizadas pelos graves crimes que cometeram", declarou o chefe da PF.

Já o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, que abriu os discursos no evento, preferiu não emitir opinião sobre a possível anistia, argumentando que o tema ainda está em análise tanto no Judiciário quanto no Legislativo.

O evento, sediado na Universidade Complutense de Madri, abordou temas relacionados à segurança jurídica e à jurisdição constitucional. O seminário ocorreu na capital espanhola e contou com ingressos comercializados ao custo de R$ 9 mil.

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) comemorou nesta terça-feira, 6, a decisão do ministro Cristiano Zanin, presidente da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), de autorizar advogados a participarem da sessão com seus celulares.

A Primeira Turma do STF decide nesta terça se recebe ou não a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra os sete acusados do "núcleo de desinformação" do plano de golpe.

A OAB chegou a orientar advogados a boicotarem a sessão se a ordem para entregar os aparelhos fosse mantida, assim como ocorreu no último julgamento do golpe. Os celulares foram colocados em sacos plásticos e lacrados pela equipe do STF.

Em nota, o presidente da OAB, Beto Simonetti, afirma que o recuo demonstra que "o diálogo prevaleceu". Ele esteve com Zanin na semana passada para conversar sobre o assunto.

"Com a decisão, o ministro prestigiou o respeito às prerrogativas profissionais", comenta Beto Simonetti.

O presidente da OAB afirma ainda que mantém o "compromisso de atuar em todas as instâncias e órgãos para proteger o livre exercício da advocacia e coibir qualquer tentativa de violação de prerrogativas".

O STF proíbe que as sessões das turmas e do plenário sejam fotografadas e filmadas pela plateia. Segundo o tribunal, a regra foi burlada no julgamento do recebimento da primeira denúncia do plano de golpe, que colocou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e sete aliados no banco dos réus. Por isso, o uso de celulares por advogados e jornalistas foi proibido na sessão seguinte, que também tinha relação com o inquérito do golpe.

Além disso, o ex-assessor da Presidência Filipe Garcia Martins, um dos denunciados, estava proibido de captar e divulgar imagens do julgamento e de aparecer nas filmagens.

Ao ser questionado pela OAB, Zanin informou que determinou a lacração dos celulares com base no poder de polícia do presidente da Primeira Turma, "após consenso entre os integrantes do colegiado, diante de questões específicas daquele julgamento".

"A providência foi pontual visou e buscou observar a liturgia da Suprema Corte, o bom andamento da sessão e o cumprimento da decisão do ministro relator, que vedou o uso da imagem de um dos denunciados presentes naquela sessão", informou o ministro.

Logo após a sessão em que os celulares foram confiscados, o tribunal foi procurado pelo Estadão e informou que a restrição havia sido pontual e que não havia previsão de a regra ser mantida em outros julgamentos.

Leia a íntegra da nota da OAB:

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) parabeniza o ministro Cristiano Zanin, presidente da Primeira Turma do STF, por ter retirado a exigência de que os advogados lacrem seus celulares para participar da sessão. O diálogo prevaleceu e, com a decisão, o ministro prestigiou o respeito às prerrogativas profissionais, de acordo com o Estatuto da Advocacia (Lei 9.806/94) e com a Constituição Federal.

A OAB destaca que a comunicação respeitosa e o compromisso com a legalidade fortalecem a relação entre as instituições e garantem a segurança jurídica. Mantemos nosso compromisso de atuar em todas as instâncias e órgãos para proteger o livre exercício da advocacia e coibir qualquer tentativa de violação de prerrogativas. A defesa da profissão é compromisso permanente e inegociável da entidade.

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou nesta terça-feira, 6, para a Primeira Turma receber denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra os sete acusados do "núcleo de desinformação" do plano de golpe.

Como relator, Moraes abriu os votos na Primeira Turma do STF. O ministro rebateu as defesas e argumentou que as acusações precisam ser analisadas no contexto do plano de golpe.

"O núcleo de desinformação tem essa importância: tentar transformar mentira em uma dúvida na sociedade em relação à democracia, às instituições, à Justiça Eleitoral", contextualizou o ministro.

Moraes destacou, por exemplo, que as fake news supostamente disseminadas pelo "núcleo de desinformação" coincidem com declarações do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em discursos públicos e lives, o que na avaliação do ministro demonstra uma atuação coordenada.

"Não se trata da acusação de que 'ah, uma pessoa simplesmente repassou uma notícia para outra'. O que a denúncia traz é o núcleo atuando em conformidade estratégica com outros núcleos, cada um dentro das suas tarefas nessa organização criminosa", complementou o ministro.

Neste grupo, estão sete denunciados que, segundo a PGR, ficaram responsáveis por "operações estratégicas de desinformação" e ataques ao sistema eleitoral e a instituições e autoridades.

As defesas buscaram descolar os denunciados das lideranças do plano de golpe. Em sustentação oral na tribuna da Primeira Turma do STF, os advogados dos sete acusados alegaram que seus clientes não tinham poder decisório nem influência suficiente para contribuir para o 8 de Janeiro.

Para o ministro, os denunciados do "núcleo de desinformação" do golpe contribuíram, "em maior ou menor extensão", para o plano golpista.

"Toda a estrutura do núcleo político, cuja denúncia já foi recebida, instrumentalizou as duas ordens pelo núcleo de desinformação, como narra a denúncia", defendeu Moraes.

Moraes é o relator das ações do plano de golpe.

O ministro também fez referência ao relatório da Polícia Federal no inquérito das milícias digitais, que apontou uma "atuação orquestrada" de bolsonaristas para promover ataques e fake news com o objetivo de ganhar projeção política e de lucrar com a monetização de notícias falsas nas redes sociais.

"Havia núcleo de produção, divulgação e financiamento de notícias fraudulentas e o núcleo político. Esses fatos são comprovados", disse Moraes.

Ele afirmou que o grupo se valeu do mesmo "modus operandi das milícias digitais" para jogar uma parcela da população contra o Poder Judiciário e o sistema eleitoral. "Não se pode relativizar a força, que pode ser uma força maléfica, das redes sociais."

Veja quem são os denunciados do 'núcleo de desinformação' do golpe:

- Ailton Gonçalves Moraes Barros, capitão reformado do Exército

- Ângelo Martins Denicoli, major da reserva do Exército

- Carlos César Moretzsohn Rocha, ex-presidente do Instituto Voto Legal;

- Giancarlo Gomes Rodrigues, subtenente do Exército e ex-servidor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin);

- Guilherme Marques de Almeida, tenente-coronel do Exército;

- Marcelo Araújo Bormevet, policial federal e ex-servidor da Abin;

- Reginaldo Vieira de Abreu, coronel do Exército.