Lula volta à China em hora de tensão com Trump e busca acordos ligando PAC à Nova Rota da seda

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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva volta à China nesta semana pela segunda vez no atual mandato e vai realizar a terceira reunião bilateral de alto nível com seu homólogo chinês, Xi Jinping. A missão do presidente brasileiro se insere num contexto de diversificação e ampliação de parcerias buscado por Lula, após o acordo estratégico selado com Xi no ano passado em Brasília. Eles devem anunciar investimentos em áreas como infraestrutura, ligando os projetos da Nova Rota da Seda e do Novo PAC, além de iniciativas em saúde e energia.

O presidente busca explorar mais a relação na Ásia, no contexto de dificuldades de relacionamento com os Estados Unidos sob o governo do presidente Donald Trump, com quem nunca falou, e que adotou políticas opostas às defendidas pelo Brasil. Lula e Trump têm posições contrárias na política, na pauta climática e sobre o funcionamento de instituições multilaterais e o comércio exterior. Parceiros no Brics, grupo de países emergentes que virou alvo da ira de Trump, Lula e Xi devem fazer uma enfática defesa do multilateralismo.

Se o Brasil recebeu tarifação extra de 10% sobre produtos exportados aos EUA, segundo maior parceiro comercial atrás da China e principal origem de investimentos, a China foi o principal alvo de Trump e as tarifas extrapolaram 100%. Ambos podem explorar oportunidades de intensificação de fluxos comerciais em consequência da guerra tarifária.

Até a semana passada, havia 16 protocolos já negociados, e outros 32 em negociação para assinatura durante a visita de Estado do petista a Pequim.

Lula, no entanto, tem sido orientado a equilibrar a estratégia e também mandou recados a Pequim de que o Brasil não deseja se tornar dependente, nem ser "quintal de ninguém", como disse em visita à Rússia. A palavra de ordem no Itamaraty, no entanto, é que a relação com a China não deve ser vista como uma contraposição aos EUA.

Direto de Moscou, Lula desembarcou em Pequim pouco antes da meia-noite deste sábado, dia 10, e terá compromissos oficiais a partir da segunda-feira, dia 12. Entre eles, um seminário com empresários brasileiros e chineses. Participam da missão executivos de multinacionais brasileiras e chinesas com presenças em ambos países como: Eurofarma, Suzano, China Merchants Port Group, Kwai, Vale, Raízen, BYD, GWM, State Grid, Ambipar, Weg, BRF Marfrig, Alibem, Bayer Brasil, Santa Felicidade, COFCO, Luckin Coffee, China Meat Association, Unem, Embrapa e BNDES.

Lula irá ao encerramento do fórum e discursará após o presidente da Apex Brasil, Jorge Viana. O painel ministerial vai contar com participação dos ministros brasileiros: Simone Tebet (Planejamento e Orçamento), Carlos Fávaro (Agricultura e Pecuária), Alexandre Silveira (Minas e Energia), Silvio Costa Filho (Portos e Aeroportos) e os presidentes do Banco Central, Gabriel Galípolo, e do Banco do Brasil, Tarciana Medeiros.

A visita foi precedida de discussões longas entre as partes, com objetivo de formalizar mais negócios privados e parcerias públicas. Os governos pretendem anunciar os projetos conjuntos que envolvem, pelo lado brasileiro, o novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e, pelo lado chinês, a Belt And Road Initiative (Iniciativa Cinturão e Rota), mais conhecida como Nova Rota da Seda. Há expectativa de aporte chinês para obras destinadas a concluir os corredores bioceânicos que atravessam a América do Sul e podem encurtar o tempo e reduzir despesas de transporte de mercadorias de e para a China.

Brasil deixou de aderir formalmente à Nova Rota da Seda

Como combinaram no ano passado, o Brasil deixou de aderir formalmente à iniciativa chinesa, frustrando uma expectativa de Xi, mas admitiu que projetos do Novo PAC e da Nova Rota da Seda deveriam ser estudados caso a caso, se pudessem ser convergentes. Uma força tarefa foi organizada para estudar as oportunidades de "sinergia" nas estratégicas de infraestrutura. O Brasil também quer investimentos em indústria naval, óleo e gás, finanças e conectividade.

A Nova Rota da Seda é um projeto de infraestrutura lançado em 2013 por Xi. Ele virou a ponta de lança da inserção chinesa globalmente, com valor trilionário em contratos, e cerca de 140 países aderiram. Na América Latina, faltam Colômbia e Brasil. Uma das primeiras ações de Trump foi ameaçar tomar o canal do Panamá de volta, incomodado com a presença de empresas de origem chinesa operando no canal, construído pelos EUA em 1914 e operado pelo país centro-americano desde 1999. Com a ameaça, o Panamá decidiu romper sua participação no projeto chinês, sob protesto de Pequim.

Desde abril, missões técnicas e políticas do Brasil viajaram à China e vice-versa. As rotas de integração sul-americanas foram apresentadas à delegação chinesa em Brasília.

Os ministros Rui Costa (Casa Civil) e Alexandre Silveira (Minas e Energia), entre outros, foram previamente à China preparar o terreno para a chegada de Lula. Os acordos estão sendo negociados até segunda-feira, dia 12.

"Teremos anúncios novos de investimentos e parcerias entre empresas brasileiras e chinesas para produzir no Brasil, desenvolver tecnologia e fazer obras de infraestrutura", garantiu, na ocasião, o ministro da Casa Civil. Costa apresentou a empresários chineses 14 leilões de rodovias que devem ocorrer no País neste ano. Até o fim do governo, a expectativa é atrair US$ 50 bilhões em investimentos rodoviários. Também visitou empresas de energia e ferrovias para metrô, VLT e trem.

Dois assuntos pendentes de encaminhamento são o envio de um casal de pandas ao Brasil, um gesto de amizade diplomática tradicional da China, e a venda de até 20 aeronaves comerciais da Embraer para operar em rotas regionais comerciais internas no país. Lula não conseguiu destravar o negócio na última visita a Pequim, em 2023. Já a cessão dos pandas foi acertada no ano passado, mas houve uma disputa interna no Brasil sobre o destino deles e também sobre as garantias das despesas elevadas para sua conservação no País tropical.

Os governadores petistas Rafael Fonteles (Piauí), Jerônimo Rodrigues (Bahia) e o presidente do Congresso Nacional, senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), também vão discursar.

O assessor especial da Presidência da República Celso Amorim, ex-chanceler de Lula, tem expressado a visão de que a China apresenta mais oportunidades e menos riscos do que os EUA, já que Trump age, segundo ele, sob a lógica transacional de um "real state agent", um corretor de imóveis. Outros nomes do governo já externaram antes uma preferência por parcerias com a China.

Já na terça-feira, 13, Lula participará como convidado especial do Fórum ministerial China-Celac (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos), e depois terá uma audiência com Xi Jinping. Além dele, são esperados chanceleres de ao menos 17 dos 33 países da Celac, e os presidentes de Honduras, Xiomara Castro; Uruguai, Yamandú Orsi; Colômbia, Gustavo Petro; e a primeira-ministra de Barbados, Mia Mottley. Todos vão discursar na abertura do Fórum de dez anos do mecanismo de inserção chinês China-Celac. Após um almoço, Lula vai para os encontros com autoridades chinesas.

O fórum é uma ferramenta de inserção chinesa na América Latina e no Caribe e ajuda a promover os interesses de Pequim na região - historicamente sob influência dos EUA, mas agora dividida politicamente entre governantes de direita e de esquerda. O subcontinente americano é tratado pela administração Trump como um "quintal" a ser dominado - e os EUA adotam uma retórica de enfrentamento para conter a presença chinesa.

A China tem interesses comerciais, estratégicos e geopolíticos na América Latina, como fomentar a construção de infraestrutura, principalmente portuária, estradas e ferrovias. A região também é palco de uma ofensiva contra Taiwan - estão na região sete dos seus únicos 12 aliados diplomáticos remanescentes. Desde 2017, Panamá, República Dominicana, El Salvador, Nicarágua e Honduras romperam com Taipei e formalizaram relações diplomáticas com Pequim.

Taipei segue perdendo terreno, sem conseguir fazer frente à China continental, que apresenta promessas de investimentos massivos, acesso ao capital de bancos estatais e poder de amplas compras comerciais com os países insulares e centro-americanos. Para isso, eles devem reconhecer o princípio de que existe "uma única China", o qual baseia a reivindicação de Pequim sobre a Ilha Formosa.

Xi Jinping tem preparado o Exército de Libertação Popular para uma possível invasão ou bloqueio sobre o território taiwanês, e realiza constantes manobras navais e aéreas ao redor da ilha. Os exercícios ficam numa zona cinzenta, mas espalham temor de que um conflito ocorra, embora autoridades taiwanesas entendam que o objetivo de Xi é vencer a uma guerra sem ter que lutar.

No ano passado, Lula cedeu e adotou uma linguagem mais favorável ao pleito histórico do Partido Comunista Chinês por "reunificação pacífica", motivando protestos do governo democrático em Taiwan, que se considera um "país de fato" e busca manter o status quo, com autonomia em relação a Pequim.

Ucrânia também deve estar na pauta

No plano geopolítico, Lula e Xi devem discutir repercussões das respectivas conversas com Vladimir Putin, enquanto estiveram em Moscou para celebrações de 80 anos do fim da Segunda Guerra Mundial. Ambos cultivam acesso e uma abordagem amigável ao líder do Kremlin e são vistos também no Ocidente como capazes de levar lobbies à consideração dele.

Brasil e China criaram um grupo de "Amigos da Paz", formado essencialmente por membros do Sul Global, e lançaram a proposta sino-brasileira com princípios para alcançar um cessar-fogo e iniciar negociações de paz, agradando mais aos russos do que aos ucranianos. O ex-chanceler brasileiro chama de proposta de texto "Amorim-Wang Yi".

Como o Estadão revelou, o governo de Volodmir Zelenski pediu que o brasileiro e o chinês intercedessem junto a Putin para uma trégua na guerra. Lula, então, sugeriu que Putin aproveitasse o cessar-fogo que havia decretado por três dias para coincidir com o feriado nacional do Dia da Vitória sobre a Alemanha nazista e o prolongasse para 30 dias. Zelenski já havia topado uma pausa por esse período, em mediação conduzida por Trump. Mas Putin resiste.

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A maior parte dos brasileiros reprova a atuação dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). De acordo com pesquisa divulgada nesta terça-feira, 5, pelo Datafolha, 36% dos entrevistados consideram ruim ou péssimo o trabalho dos magistrados.

O estudo também constatou que aqueles que consideram as decisões dos juízes são ótimas ou boas somam 29%. Enquanto isso, 31% pensam que os ministros têm desempenho regular e 4% dos entrevistados não sabem opinar.

Dentre os entrevistados, a maioria (68%) considerou que a Corte prioriza os próprios interesses e apenas 27% afirmaram que eles pensam em primeiro lugar na população.

A medição foi feita pelo instituto entre os dias 29 e 30 de julho, ou seja, antes da prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), por desobedecer as medidas cautelares, ser decretada pelo ministro Alexandre de Moraes.

Após a prisão do ex-presidente, seus apoiadores e filhos desferiram ataques contra a Corte, afirmando que o Tribunal minou a democracia brasileira e pedindo o impeachment de Moraes. Os deputados Luciano Zucco (PL-RS) e Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) incentivaram seguidores a usar os termos "vingança não é justiça" nas redes sociais, para atacar o STF.

A pesquisa demonstrou que, dentre os bolsonaristas, 81% reprovam o trabalho dos ministros do STF e apenas 2% são favoráveis. Os petistas, por outro lado, são mais alinhados com a Corte: 59% têm avaliação positiva e 9% negativa.

A reprovação do STF subiu desde a última medição realizada pelo Datafolha. Em março de 2024, 28% dos brasileiros reprovavam a Corte e uma ligeira maioria, de 29% dos entrevistados, era a favor da atuação. Na ocasião, 40% dos participantes ainda consideraram os ministros com atuação regular e 3% não opinou

Desde a data, os embates entre o Supremo e atores políticos aumentaram. Oito magistrados da Corte chegaram a ser sancionados com a cassação de seus vistos americanos em retaliação ao processo que conduzem contra Jair Bolsonaro, investigando a participação do ex-presidente na tentativa de golpe de Estado.

O principal articulador das sanções é o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que está autoexilado nos EUA e pede pelos ataques. O parlamentar também pediu pela aplicação da Lei Global Magnistsky contra Alexandre de Moraes, o dispositivo legal o impede de acessar bens nos EUA, de visitar o país e de ter acesso a serviços de empresas americanas.

De acordo com pesquisa Datafolha divulgada nesta terça-feira, 5, 35% dos brasileiros consideram a atuação do Congresso Nacional ruim ou péssima. Ao mesmo tempo, os entrevistados que acham o trabalho dos parlamentares regular somaram 41%. Apenas 18% dos participantes afirmaram que o Legislativo é ótimo ou bom, enquanto 6% não opinaram.

A reprovação da Câmara dos Deputados e do Senado, manifestada pela maior parte dos entrevistados, é acompanhada por uma percepção de que o Legislativo privilegia os próprios interesses. Ao todo, 78% dos entrevistados afirmaram que os congressistas dão prioridade a eles mesmos. Somente 18% dos participantes acreditam que o povo é prioridade no Congresso.

A desaprovação ao Congresso se elevou desde a última aferição feita pelo Datafolha. Em março do ano passado, 23% consideravam o Legislativo ruim ou péssimo e 22% ótimo ou bom. A avaliação de que os parlamentares atuavam de forma regular era compartilhada por 53% na ocasião. Por fim, 2% não responderam a pesquisa.

O aumento da desaprovação ocorre após embates entre o Congresso e Executivo. Os senadores e deputados federais acumulam uma série de atritos com a presidência, como a derrubada do aumento do IOF, de interesse do presidente Lula (PT), e o veto do aumento no número de deputados, desejo da Câmara.

Governistas chegaram a levantar uma campanha nas redes sociais com os dizeres "Congresso inimigo do povo" para atacar as Casas. O governo usou, durante esse período, diversos posts feitos com inteligência artificial para criticar a Câmara e o Senado.

Dentre os petistas, a pesquisa identificou que 28% avaliam o Congresso como ruim e 26% bom ou ótimo. Os bolsonaristas, em maior parte, também rejeitam o Legislativo: 38% consideram que a atuação dos senadores e deputados federais é ruim e apenas 14% a avaliam como boa.

A pesquisa 2004 pessoas entre os dias 29 e 30 de julho. A margem de erro do estudo é de dois pontos percentuais e a confiabilidade é de 95%.

O presidente da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados, deputado federal Paulo Azi (União-BA), definiu na tarde desta terça-feira, 5, as diligências que serão realizadas no processo de cassação do mandato da deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), que está presa em Roma, na Itália, desde o último dia 29.

Segundo Azi, a fase de instrução probatória do processo inclui a oitiva da deputada, a ser realizada por videoconferência, e de testemunhas convidadas. Ainda não há data marcada para as reuniões. As regras foram acordadas entre ele e o deputado Diego Garcia (Republicanos-PR), relator da ação.

Zambelli foi condenada a dez anos de prisão pela invasão ao sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Os ministros também determinaram a perda do cargo na Câmara dos Deputados. Dias após a sentença, a deputada deixou o Brasil e seguiu para os Estados Unidos, onde anunciou que não voltaria ao País. Dias depois, fugiu para Itália, onde possui dupla cidadania na crença de que seria poupada de cumprir pena.

O hacker Walter Delgatti Neto, condenado a 8 anos e 3 meses de reclusão por invadir sistemas da Justiça brasileira com Zambelli, será convidado pelos deputados para audiência.

A defesa da deputada apresentou pedido de acareação entre ela e o hacker como meio necessário para "dirimir eventuais contradições e confrontar as versões apresentadas". No informativo desta terça-feira, os deputados esclareceram que indeferiram o pedido da confrontação entre as testemunhas, por "ausência de previsão regimental".

Além de Delgatti, Flávio Vieitez Reis e Felipe Monteiro de Andrade, delegado e agente da Polícia Federal (PF), respectivamente, que trabalharam no caso, também serão ouvidos pelos parlamentares, caso aceitem participar das oitivas.

O ex-ministro da Defesa de Jair Bolsonaro (PL) que se encontrou com Delgatti, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, também será convidado, assim como Michel Spiero, assistente técnico de defesa de Zambelli que atuou na ação penal do Supremo Tribunal Federal (STF) que condenou a deputada.

A CCJC é responsável por analisar o processo de cassação e emitir parecer favorável ou contrário à perda de mandato. Em caso de parecer positivo, o processo segue para votação no plenário da Câmara. São necessários os votos de 257 deputados para que a cassação se concretize.