Após investigação da PF, ministro de Israel acusa Judiciário e Lula de apoiarem terroristas

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O ministro de Assuntos da Diáspora e Combate ao Antissemitismo de Israel, Amichai Chikli, disse no domingo, 5, em carta enviada ao deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL) que é "uma desgraça para o governo brasileiro" a investigação contra um militar israelense que estava de férias no Brasil. No pronunciamento, Chikli acusa o Judiciário brasileiro de agir com o apoio do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, a favor de terroristas.

A manifestação de Chikli é uma reação à investigação aberta pela Polícia Federal, a pedido da Justiça brasileira, contra o militar Yuval Vagdani, denunciado pela entidade pró-Palestina Fundação Hind Rajab (HRF, na sigla em inglês) de cometer crimes de guerra na Faixa de Gaza.

Vagdani estava de férias na praia de Morro de São Paulo, na Bahia, e deixou o país com o apoio do governo israelense após a investigação ser aberta.

Chikli acusa a HRF, que se autodenomina em defesa dos direitos humanos, de ser uma organização que apoia o terrorismo. "Pesquisas do nosso ministério revelaram que os líderes da organização têm apoiado consistentemente o Hezbollah, o Hamas e outros grupos terroristas que buscam a destruição de Israel e o assassinato de israelenses", escreveu.

Em seguida, o ministro descreve que líderes da organização elogiaram membros das duas organizações e acusa a HRF de mentir sobre o militar. "O fato do Judiciário brasileiro, sob o apoio do presidente Lula, abraçar indivíduos com essas visões extremistas - especialmente no momento em que se aproxima o 80.º aniversário da libertação de Auschwitz - é uma desgraça para o governo brasileiro", disse.

Apesar das críticas e acusações de apoio, o presidente Lula não se pronunciou sobre o caso de Yuval Vagdani.

A investigação contra o militar no Brasil começou a partir da denúncia da HRF, que se baseou no princípio de "jurisdição universal", segundo o qual determinados crimes são tão graves que atentam contra a própria noção de humanidade - o que permite que eles sejam julgados em qualquer lugar.

A entidade reuniu um dossiê para acusá-lo de crimes de guerra, que inclui vídeos, dados de geolocalização e fotografias que mostram o soldado demolindo casas em uma área de ajuda humanitária.

O pedido da HRF foi apresentado à Justiça Federal, em Brasília, por dois advogados brasileiros contratados pela entidade.

Após as acusações se tornarem públicas, Israel ajudou o soldado a deixar o país e ir para a Argentina.

Ao Estadão, a Embaixada de Israel em Brasília afirmou que manteve contatos telefônicos com o soldado sobre o processo para ele retornar ao país, mas destacou que a decisão de deixar o Brasil foi dele.

Criada por dezenas de advogados e juristas no ano passado, a HRF tem o objetivo de denunciar soldados israelenses que estejam em outros países, para que eles sejam condenados e presos por crimes de guerra.

As ações correm em paralelo a dois processos maiores - e mais lentos - contra Israel: o da Corte Internacional de Justiça, que acusa o Estado de Israel de cometer genocídio em Gaza; e o do Tribunal Penal Internacional (TPI) contra autoridades israelenses, incluindo o primeiro-ministro Binyamin Netanyahu.

Segundo o jornal francês Le Figaro, ações semelhantes contra soldados israelenses foram realizadas na Europa, onde pelo menos três soldados israelenses que estavam de férias no Chipre, na Eslovênia e na Holanda, voltaram a Israel por recomendação dos serviços de inteligência israelenses.

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A Justiça Eleitoral de Minas Gerais aceitou denúncia do Ministério Público Estadual contra o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG). Ele se tornou réu acusado de divulgar notícias falsas e denunciação caluniosa contra o ex-prefeito de Belo Horizonte Fuad Noman na eleição de 2024. Fuad venceu o pleito, mas morreu em março deste ano vítima de câncer. A decisão foi tomada pelo juiz Marcos Antônio da Silva.

O deputado estadual Bruno Engler (PL), aliado de Nikolas que disputou a eleição para prefeito da capital mineira, a deputada estadual Delegada Sheila (PL) e a candidata a vice na chapa Cláudia Romualdo também se tornaram réus pelos mesmos crimes. O MP pediu que eles tenham os direitos políticos suspensos, o que os deixaria inelegíveis, e paguem indenização por danos morais.

Nikolas se posicionou sobre a decisão. "Devia ter feito rachadinha ou roubado o INSS. Vacilei, fui dar minha opinião", declarou. Engler e Sheila também foram procurados pelo Estadão, mas ainda não se posicionaram. A reportagem não conseguiu contato com Cláudia Romualdo.

Na reta final do segundo turno, adversários de Fuad utilizaram o livro Cobiça, escrito por ele, para acusá-lo de apologia à pedofilia. Em uma passagem da obra, a personagem rememora que foi vítima de estupro coletivo quando tinha 12 anos.

O Ministério Público afirmou que "o grupo disseminou intencionalmente informações que sabia ser inverídicas". A ação teria se dado em duas frentes: propagação de "trechos descontextualizados de obra literária de autoria do candidato e falsa imputação de responsabilidade por suposta exposição de crianças a conteúdo impróprio".

Em um vídeo divulgado nas redes sociais à época, Nikolas disse que o livro era "pornográfico". Segundo o Ministério Público, o deputado relacionou uma obra ficcional a um evento real, ao afirmar, "de forma leviana e injusta", que "o problema é quando a ficção vira a realidade e, pior, chega até seu filho". O parlamentar acusava a gestão Fuad de promover uma feira de quadrinhos na qual crianças foram expostas a "nudez, a pornografia ou até mesmo o satanismo".

Engler e Romualdo levaram o tema para a propaganda eleitoral. "Uma peça completamente perturbadora, escrita pelo prefeito Fuad Noman, um livro erótico, no qual ele descreve o estupro coletivo de uma criança de 12 anos de idade", disse o então candidato a prefeito pelo PL em uma das peças. A propaganda afirma ainda que a feira de quadrinhos tinha conteúdo sexualmente explícito.

Sheila adotou a mesma linha ao escrever em uma publicação que Fuad poderia escrever sobre o que quiser, mas que o "problema surge exatamente quando a ficção se encontra com a realidade", também mencionando o evento.

Os quatro réus terão 10 dias para responderem à acusação, juntar documentos, provas e indicar testemunhas de defesa.

O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) deixou a Aliança Internacional para a Memória do Holocausto (IHRA, na sigla em inglês), uma organização internacional criada para o combate ao antissemitismo e memória do massacre dos judeus.

A informação foi divulgada pelo Ministério das Relações Exteriores de Israel na quinta-feira, 24, e confirmada por fontes do Itamaraty. O entendimento do governo é que a adesão à IHRA em 2021, durante o governo de Jair Bolsonaro, foi feito de modo displicente.

Fontes do Itamaraty informaram que entre os motivos da saída, que ainda não foi formalizada (o Brasil aparece no site da IHRA como membro observador), estão obrigações que o País deveria ter com a aliança, que envolveria recursos financeiros.

No dia 23, o governo brasileiro formalizou a entrada na ação movida pela África do Sul na Corte Internacional de Justiça que acusa Israel de cometer genocídio contra palestinos na Faixa de Gaza. O Itamaraty nega que a saída da aliança tenha uma relação direta com a adesão à ação.

O Itamaraty criticou Israel pela campanha militar na Faixa de Gaza, que dura quase dois anos apesar da devastação do território palestino e da morte dos principais líderes do Hamas, na nota em que informou a adesão ao processo da África do Sul. As ações na Cisjordânia, território palestino onde Israel também atua militarmente com frequência e que tem ocupação de colonos judeus, também foram criticadas.

"O Brasil considera que já não há espaço para ambiguidade moral nem omissão política. A impunidade mina a legalidade internacional e compromete a credibilidade do sistema multilateral", diz a nota do Itamaraty.

As ações do governo brasileiro foram chamadas por Israel de "uma demonstração de profunda falha moral". Desde o início da guerra em Gaza em 2023, a relação entre o Estado judaico e o País tem se deteriorado. Em fevereiro do ano passado, Lula afirmou que as ações do Exército israelense em Gaza era comparado ao Holocausto de judeus e foi considerado persona non grata em Israel.

O episódio provocou a retirada do embaixador do Brasil em Israel, Frederico Meyer, em maio. O cargo segue vago, e as relações diplomáticas entre os dois países correm o risco de ficarem ainda menores nos próximos meses, já que o Itamaraty segue sem consentir que o diplomata Gali Dagan assuma o cargo de embaixador de Israel em Brasília. O cargo atualmente é ocupado por Daniel Zonshine.

A saída da IHRA e a adesão à ação da África do Sul esta semana, no entanto, coincidem com o aumento da pressão da comunidade internacional sobre Israel, que contou com o anúncio do presidente francês Emmanuel Macron sobre o reconhecimento do Estado da Palestina e com a denúncia de organizações humanitárias sobre fome generalizada entre os palestinos.

O Itamaraty saudou na quinta a decisão de Macron de reconhecer o Estado da Palestina na Assembleia Geral da ONU, marcada para setembro - ato que também foi criticado por Israel.

Críticas a IHRA

A Aliança Internacional para a Memória do Holocausto (IHRA) se define como uma união de governos e especialistas para "fortalecer, avançar e promover a educação, a memória e a pesquisa sobre o Holocausto". Criada na década de 90, o grupo tem 35 membros e 8 observadores (incluindo o Brasil, que, até este sábado, segue como observador no site).

Segundo a organização, os membros da aliança precisam reconhecer que "a coordenação política internacional é essencial para combater a crescente distorção do holocausto e do antissemitismo".

A IHRA é criticada por setores do judaísmo e grupos em defesa dos direitos humanos, que acusam a organização de instrumentalizar a memória do Holocausto para blindar o Estado de Israel em casos de violência. A definição de antissemitismo da organização, adotada por países europeus e pelos Estados Unidos, dizem os críticos, considera que posições contrárias à Israel podem ser consideradas antissemita.

Em 2023, um grupo composto por mais de 100 organizações de direitos humanos, entre elas a B'TSelem, maior organização de direitos humanos de Israel, Humans Right Watch, Anistia Internacional e União Americana pelas Liberdades, solicitou à ONU a rejeição do conceito de antissemitismo do IHRA.

A crítica também é feita por um dos principais formuladores da definição, Kenneth Stern, advogado especialista em direitos humanos.

"A adoção da definição por governos e instituições é frequentemente enquadrada como um passo essencial nos esforços para combater o antissemitismo. Na prática, porém, a definição da IHRA tem sido frequentemente usada para rotular erroneamente as críticas a Israel como antissemitas e, assim, coibir e, às vezes, suprimir protestos não violentos, ativismo e discursos críticos a Israel e/ou ao sionismo, inclusive nos EUA e na Europa", afirmava a carta do grupo.

Os maiores problemas, diz o grupo, residem nos 7 dos 11 "exemplos contemporâneos de antissemitismo" informado pela IHRA, anexados à definição para orientar a aplicação. Os exemplos incluem "a alegação de que a existência de um Estado de Israel é um esforço racista" e "a aplicação de dois pesos e duas medidas ao exigir de [Israel] um comportamento não esperado ou exigido de nenhuma outra nação democrática".

O ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes determinou que um pedido para investigação do deputado Filipe Barros (PL-PR) seja juntado aos autos do inquérito que mira o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) por supostos crimes de coação no curso do processo, obstrução de investigação sobre organização criminosa e abolição violenta do Estado Democrático de Direito.

A movimentação consta de despacho assinado na quinta, 24, e não implica na automática investigação do parlamentar. A decisão significa que o teor da notícia-crime será analisado no bojo do inquérito que trata de fatos semelhantes. O procurador-geral da República, Paulo Gonet, deve se manifestar sobre a solicitação antes de uma eventual inclusão do parlamentar no inquérito.

"Considerando que os fatos narrados nesta notícia-crime já são objeto de procedimento específico, também de minha relatoria, junte-se cópia destes autos ao inq 4995/DF", escreveu Moraes no despacho.

A notícia-crime foi apresentada ao STF pelo advogado Benedito Silva Junior, que imputou a Filipe Barros suposto crime contra a soberania nacional. A base da petição é uma notícia sobre uma viagem que o parlamentar, presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara, fez aos Estados Unidos em maio.

Segundo a notícia publicada pelo portal Metrópoles - mote da solicitação de Benedito -, durante a viagem Filipe Barros teria tido reuniões com Eduardo Bolsonaro e um congressista americano para tratar de eventuais sanções a Moraes.

O advogado sustenta que o deputado bolsonarista teria participado de "articulações para comprometer a independência do Judiciário e submeter decisões judiciais nacionais à influência de um governo estrangeiro".